Cavalos semisselvagens podem ajudar a reduzir o risco de incêndios florestais e aumentar a biodiversidade
A “Rewilding Europe” está a reintroduzir cavalos semisselvagens em muitas paisagens da Europa, como o cavalo Sorraia, no Vale do Côa. Um estudo recente demonstra que o pastoreio desta espécie também pode aumentar a biodiversidade nas paisagens mediterrânicas.

A Rewilding Europe é uma organização sem fins lucrativos criada em 2011, com sede em Nijmegen, na Holanda. Dedica-se a criar paisagens renaturalizadas em todo o continente europeu e os seus esforços já contribuíram para recuperar, por exemplo, o número de indivíduos de espécies anteriormente ameaçadas de extinção como o bisonte-europeu e o lince-ibérico.
Desde a sua fundação, a Rewilding Europe reintroduziu e reforçou populações de cavalos semisselvagens em muitas das suas paisagens, desde os cavalos de Przewalski, em Espanha, aos cavalos Konik e Karakachan, nas montanhas Rhodope da Bulgária e, ainda, o cavalo Sorraia, no grande vale do Côa, onde a presença destas raças icónicas na paisagem também “pode impulsionar o crescimento do turismo baseado na natureza”.
No âmbito destas experiências, a Rewilding Europe percebeu que os cavalos selvagens e semisselvagens desempenham um papel ecológico considerado “essencial”, através do seu pastoreio natural e de outras interações com as paisagens e a sua vida selvagem.
Além disso, “os grandes herbívoros, como os cavalos, podem proporcionar benefícios socioeconómicos” nas regiões onde estão instalados, refere-se nas conclusões do mesmo estudo. É que, ao consumirem vegetação inflamável, os cavalos selvagens “podem reduzir a quantidade de combustível disponível para incêndios florestais catastróficos”.
Pastoreio de cavalos semisselvagens
Os investigadores envolvidos no estudo exploraram o impacto da transição do pastoreio extensivo de gado tradicional para o pastoreio de cavalos semisselvagens em duas áreas rewilding – Vale Carapito e Ermo das Águias – durante um período de três anos.

Ambas as áreas rewilding são agora exclusivamente pastoreadas por cavalos Sorraia – uma raça autóctone portuguesa adaptada a viver em condições selvagens ou semisselvagens – que foram reintroduzidos pela equipa da Rewilding Portugal. As parcelas em ambos os locais foram vedadas e usadas como locais de controle sem pastoreio.
Declínio da agricultura e do pastoreio
Os resultados do estudo cujas conclusões acabam de ser divulgadas mostram que “o pastoreio de cavalos nas duas áreas rewilding reduziu o risco de surtos catastróficos de incêndios florestais, reduzindo a altura e a quantidade de vegetação”.
De acordo com a Rewilding Europe, “este impacto é particularmente relevante para as paisagens rurais da região mediterrânica, onde os incêndios florestais – que podem ser devastadores para as pessoas, as propriedades e a natureza selvagem – são agora cada vez mais comuns”.
Os dois fatores subjacentes a esta tendência são “as temperaturas mais extremas resultantes das alterações climáticas e o declínio da agricultura e do pastoreio por parte do gado”, que está a levar ao crescimento desregulado de gramíneas e arbustos.

O estudo também mostrou que, embora os cavalos nas áreas rewilding tenham ajudado a controlar as gramíneas através do seu pastoreio, “tiveram pouco impacto na vegetação lenhosa, que também é facilmente combustível”.
Este facto, dizem os investigadores, “alinha-se com a abordagem de rewilding para impulsionar o pastoreio natural, que visa trazer de volta diferentes tipos de herbívoros selvagens e semi-selvagens nas mesmas paisagens para amplificar o seu impacto positivo”.
Recuperar de incêndios intensos
Mas os benefícios da reintrodução de herbívoros como os cavalos semisselvagens não se limitam à redução do risco de incêndio. O estudo do grande vale do Côa também mostrou que “o pastoreio por cavalos Sorraia aumentou a proporção de plantas com flor na paisagem, o que, por sua vez, pode aumentar a quantidade de alimento disponível para insetos polinizadores, como abelhas e borboletas”.
Numa outra vertente, o pastoreio natural pelos cavalos também “aumentou a quantidade de matéria orgânica no solo”, por via dos dejetos que são libertados pelos animais, o que é considerado fundamental para aumentar a biodiversidade do solo, e “apoiou o crescimento de diferentes espécies de árvores autóctones”.
Este segundo impacto, dizem os especialistas da Rewilding Europe, é “particularmente importante” em locais onde a natureza selvagem está a recuperar de incêndios intensos e recorrentes, como é o caso de Ermo das Águias.