O castor-europeu regressou a Portugal e temos de fazer de tudo para que se sinta bem-vindo
Após uma ausência de 500 anos, a espécie foi avistada no Douro Internacional. A Rewilding Portugal avisa, porém, que sem medidas de proteção, a visita pode ser de curta duração.

Após 500 anos de ausência, o castor-europeu (Castor fiber) regressou ao território português. A sua presença foi detetada no Parque Natural do Douro Internacional, junto à fronteira com Espanha.
O momento foi de grande emoção para a equipa de biólogos da organização Rewilding Portugal. Não é caso para menos.
A caça intensiva e a destruição de habitat conduziram à extinção da espécie no nosso país. Mas a Natureza, quando lhe é dada condições, tem esse dom extraordinário de regeneração, oferecendo-nos uma segunda oportunidade.
Duas décadas de trabalho para recuperar uma espécie extinta
Em Espanha, a recuperação do castor-europeu começou em 2003, na bacia do rio Ebro, com a reintrodução não oficial de 18 animais vindos da Europa Central.
Será, no entanto, apenas em 2018 que a Comissão Europeia declarou o castor uma espécie historicamente nativa. O Governo espanhol seguiu o exemplo, nesse mesmo ano, criando condições para a sua expansão.
A espécie, ao longo destes últimos anos, foi sendo avistada em vários locais do território de Espanha, incluindo o Guadalquivir e um afluente do rio Douro, próximo da fronteira com Portugal.

Recentemente, em fevereiro deste ano, foram avistados castores no rio Tejo, do lado espanhol, marcando um novo local de presença da espécie.
Foram, portanto, mais de duas décadas de recuperação populacional em Espanha, com sinais de aproximação da espécie, junto ao território nacional, registadas em ações de monitorização levadas a cabo pela Rewilding Portugal.
Era por isso uma questão de tempo até o castor-europeu atravessar a fronteira e visitar o nosso país. Indícios inequívocos da sua presença foram sendo detetados nos anos mais recentes.
Os primeiros sinais da presença em território português
Marcas de roedura em árvores e diques construídos no curso da água, típicas da atividade desta espécie levou a equipa da Rewilding Portugal a colocar câmaras de fotoarmadilhagem que, finalmente, apanharam, em maio deste ano, o mamífero roedor que há praticamente cinco séculos abandonara o nosso país.
Diante de uma espécie adulta em pleno território português, os biólogos não hesitaram em comemorar o retorno do castor-europeu a Portugal.
Pedro Prata, coordenador de Equipa da Rewilding Portugal.
O castor-europeu é uma peça-chave para assegurar o equilíbrio e a biodiversidade dos ecossistemas aquáticos. O seu papel é determinante para criar habitats, melhorar a qualidade da água e regular o fluxo hídrico.
O grande engenheiro dos ecossistemas
As represas construídas pelos castores criam zonas húmidas, lagos e lagoas, fornecendo novos habitats para uma variedade de espécies de plantas e animais, como peixes, anfíbios e aves.
Retendo a água e os sedimentos, essas represas também ajudam a reduzir o risco de enchentes, contribuindo ainda para a água se infiltrar nos solos e reabastecer os lençóis freáticos.

Tão importante é igualmente a vegetação que cresce ao redor desses diques, ajudando as margens dos rios a combater a erosão. A presença de castores nos rios contribui, como tal, para o restauro de ecossistemas degradados.
Beneficiando do seu talento, a natureza recupera não só a biodiversidade como também a resiliência para enfrentar secas e incêndios, bem como outros efeitos das alterações climáticas.
Pedro Prata, coordenador de equipa da Rewilding Portugal.
Desconfiando que o regresso do castor-europeu ao nosso país estava para breve, a Rewilding Portugal tem vindo, nos anos mais recentes, a apelar às autoridades nacionais e regionais para prepararem a sua chegada.
Perante o que dizem ter sido uma ausência total de respostas, a organização defende que ainda se vai a tempo de apoiar o retorno do castor com um plano para antecipar possíveis conflitos com comunidades.
Os desafios para uma coexistência pacífica com os humanos
O regresso desta espécie implica desafios, pois poderá destruir plantações ribeirinhas ou infraestruturas mal-adaptadas à dinâmica natural dos rios, adverte a organização.
É urgente, por isso, lançar medidas de mitigação que podem aliás ter como referência as experiências de outros países europeus, que investiram em sensibilização e acompanhamento técnico para assegurar que a vinda desta espécie represente uma oportunidade e não um obstáculo.

Na Suécia por exemplo, o castor foi reintroduzido na década de 1920, tendo sido criados programas de compensação financeira a agricultores e proprietários florestais afetados por inundações provocadas por represas.
A Alemanha, por outro lado, encorajou a formação de Beaver Managers – mediadores de conflitos entre castores e atividades humanas – que facilitam a instalação de dispositivos de controlo de níveis de água para regular a altura da água sem destruir as barragens.
A Suíça tem barreiras protetoras junto a campos agrícolas e árvores valiosas enquanto a França apostou na informação junto da população sobre a importância da espécie para os ecossistemas aquáticos.
Oportunidade a não desperdiçar
Assumindo que a presença do castor é um “marco histórico” para a preservação da natureza no nosso país, a Rewilding Portugal adverte que esta é uma oportunidade única para proteger os habitats ribeirinhos, restaurar corredores ecológicos e apoiar o regresso de espécies essenciais para o equilíbrio dos ecossistemas.

O castor já chegou a Portugal. Mas só isso não chega. É preciso criar as condições para que a espécie se sinta bem-vinda e queira ficar deste lado da fronteira.
Referência da notícia
Mais de 500 anos depois, o Castor está de volta a Portugal. Rewilding Portugal