Enquanto a Europa “coze”, a América do Sul vive dias de frio extremo: o gelo chega a Buenos Aires

A Terra possui várias massas de ar, correntes de vento e marinhas e está em constante movimento. Afinal, qual é a relação entre o frio extremo da América do Sul, o calor tórrido na Europa e o aquecimento global? Explicamos-lhe aqui!

Se considerarmos apenas os registos do mês de junho, o registo de 30 de junho no Observatório Central de Buenos Aires ocupa o terceiro lugar. Por outro lado, Aeroparque, Ezeiza, El Palomar e La Plata estabeleceram um novo recorde mensal.

Na América do Sul, e em particular na Argentina (recordemos que é um país situado no hemisfério Sul), a situação meteorológica que se vive mantém-se preocupante devido à duração da vaga de frio. De acordo com um dos peritos da Meteored Argentina, Leonardo de Benedictis, “províncias como Chubut estão sob aviso vermelho, enquanto o Centro e o Sul estão sob aviso laranja e a faixa Norte mantém o aviso amarelo”.

As geadas severas, em combinação com o frio intenso e persistente, geram impactos cumulativos, especialmente para grupos de risco e para a agricultura (campos e culturas agrícolas).

Não obstante, ainda segundo De Benedictis, “as condições meteorológicas apresentam-se estáveis, dominadas pelo vento Norte”. Isto provocará uma lenta e gradual recuperação da temperatura do ar. Porém, um dos meteorologistas argentinos da Meteored alerta para o facto de que o regresso a valores de temperatura “próximos do normal" só irá consolidar-se na reta final desta semana.

Buenos Aires registou a sexta temperatura máxima mais baixa da história!

Na passada segunda-feira, 30 de junho, o frio fez história na AMBA (Area Metropolitana de Buenos Aires), pelo menos, no que ao histórico recente climático-meteorológico diz respeito. De acordo com Christian Garavaglia da Meteored Argentina, "há muitos anos que não se registava uma tarde tão fria".

Segundo Garavaglia, "as diferentes previsões numéricas não previram corretamente tal situação, e a abundante nebulosidade e o vento moderado de sul contribuíram para manter a atmosfera extremamente fria durante todo o dia".

Um dos exemplos mais proeminentes em termos de valor térmico obtido foi a cidade de Buenos Aires, onde o termómetro assinalou uma invulgar temperatura máxima de somente 5,6 °C. De acordo com a Meteored Argentina, este valor constitui a sexta temperatura máxima mais baixa de toda a série de registos que remonta a 1906 (ou seja, quase 120 anos!). É mesmo muito frio, hã?

Na última ocasião em tinham sido registadas temperaturas máximas tão baixas em Buenos Aires foi durante o histórico nevão de 2007. Também vale a pena mencionar há alguns dias as sensações térmicas negativas nos subúrbios durante todo o dia, algo difícil de ver no meio da tarde.

Porque é que no hemisfério Sul faz frio agora e no hemisfério Norte é o seu oposto?

Nos países situados a sul da linha do Equador (hemisfério Sul) vive-se agora o inverno porque esta região meridional do Globo está, neste momento do ano, inclinada para longe do Sol, recebendo menos luz solar direta. Ao mesmo tempo, o hemisfério Norte está inclinado para o Sol, experienciando o verão, a estação com mais horas de luz solar e temperaturas mais elevadas.

Esta diferença é causada pela inclinação do eixo de rotação da Terra em relação ao Sol, o que faz com que os hemisférios recebam diferentes quantidades de luz solar durante o ano.

A inclinação do eixo da Terra, de aproximadamente 23,5 graus, faz com que os hemisférios sejam iluminados de forma desigual durante o movimento de translação da Terra em redor do Sol. Quando o hemisfério Norte se inclina em direção ao Sol, recebe mais luz solar e calor, o que se traduz naquilo que conhecemos como verão, enquanto o hemisfério Sul, inclinado para longe, recebe menos luz e calor, gerando-se o inverno.

Frio extremo e persistente num continente, calor tórrido e persistente no outro. Ambos estão a registar valores extremos, o que só reforça a ideia de que as mudanças climáticas estão em curso e que o aquecimento global, factualmente, é real, tendo em conta o histórico climatológico das várias estações oficiais distribuídas a nível mundial.

É importante perceber que as estações do ano são opostas nos dois hemisférios devido a esta inclinação e ao movimento de translação da Terra. Portanto, quando um hemisfério está no verão, o outro está no inverno, e vice-versa.

América do Sul sob persistente e invulgar vaga de frio e vários países da Europa a “cozer” ao Sol

Poderíamos pensar que, pelo simples facto, de estar muito frio numa região do globo e muito calor noutra, estaríamos livres do aquecimento global ou das alterações ou mudanças climáticas.

No entanto, esta disparidade é explicada sim. Como já referido acima, relaciona-se com o movimento de translação da Terra em relação ao sol.

Os valores térmicos extremos, quer os que foram registados na AMBA (Buenos Aires, Argentina), quer os que têm vindo a ser registados em vários países europeus e sobretudo situados nas imediações da bacia do Mediterrâneo (Portugal, Espanha, França, Itália, Grécia, entre outros). Quer no frio, quer no calor, estes valores de temperatura são demasiado elevados para a época do ano.

Apesar da normalidade da situação de opostos em termos de estações do ano, o que não é normal são os valores térmicos registados em ambos os hemisférios, em simultâneo.

Isto é, aquilo que acontece sobre um local qualquer da Terra pode não acontecer da mesma forma noutro. No entanto, o aquecimento global e a tendencial subida das temperaturas é inegável.

Os dados científicos mostram, factualmente, que a temperatura do Globo tem vindo a subir gradualmente ao longo de todo o século XX (apesar de anos mais frios), especialmente a partir de 1980, década a partir da qual essa subida nas temperaturas globais ainda foi mais marcada.

Apesar disso, houve anos, entre 1980 e a atualidade, em que ocorreu um pontual abrandamento ou até mesmo estagnação térmica, fruto de fenómenos naturais vulcânicos, por exemplo, que os cientistas dizem ter abrandado temporariamente a escalada da subida global das temperaturas. Os dados da temperatura são impactantes e revelam uma realidade climática inegável: o aquecimento global existe.

O facto de estar calor tórrido e extremo para a época na Europa, e uma vaga de frio persistente e igualmente perigosa para a saúde em plena América do Sul, só reforça o evidente facto de que estamos todos a assistir, perante os nossos olhos, ao aquecimento global “em direto”.

A bacia do Mediterrâneo vai "fervendo" por estes dias. Tanto a temperatura à superfície do mar, como a temperatura medida a 2 metros, revelam valores inequivocamente elevados para a época do ano.

Quanto à Europa per se, sobretudo os países acima mencionados que pertencem à influência do Mediterrâneo, o calor intenso ou extremo explica-se pelas temperaturas muito elevadas à superfície do mar (24 até 30 ºC) que ameaçam a biodiversidade e ecossistemas locais e regionais.

Por sua vez, estas ondas de calor marinhas, têm o potencial de desencadear trovoadas e granizadas severas e ainda alimentam indiretamente as massas de ar tropical continental provenientes do Norte de África, gerando todo um mecanismo climático, que se retro-alimenta e vai deixando temperaturas elevadas na superfície terrestre (medida a 2 metros). Aliando-se a isto os ventos secos e quentes torna-se muito difícil, para os europeus, enfrentar este calor tão intenso.

Por fim, é importante esclarecer que, pelo facto de partes do Globo não estarem a testemunhar muito calor, mas sim muito frio, isso não invalida, de forma alguma, o indubitável aquecimento global, aliado às alterações/mudanças climáticas que já todos vamos sentindo na pele. Ou seja, apesar da aparente contradição, o aquecimento global e as alterações climáticas, sim, existem. É tempo de agirmos.