Como se comportaram as barragens em Portugal Continental em setembro e quais as perspetivas para outubro?

As barragens em Portugal continental apresentam sinais de descida generalizada após um verão quente e seco. O início do ano hidrológico arranca com reservas frágeis, sobretudo no sul do país. As previsões para outubro apontam para menos chuva e mais calor, prolongando a pressão sobre os recursos hídricos.

76% do volume total de armazenamento nas albufeiras em Portugal
Na última semana de setembro as albufeiras registaram uma redução no volume de armazenamento, cifrando-se agora em 76% do total.

As reservas de água armazenadas nas barragens de Portugal continental registaram uma descida generalizada no final de setembro, refletindo os efeitos de um verão prolongado e quente. O último boletim oficial, referente a 22 de setembro de 2025, indicava que todas as bacias hidrográficas perderam volume face à semana anterior.

30% das albufeiras em monitorização apresentam disponibilidades hídricas superiores a 80% do volume total

Das albufeiras monitorizadas, 30% apresentavam disponibilidades hídricas superiores a 80% do volume total, mas 5% encontravam-se já abaixo de 40%, um patamar considerado crítico. Este balanço marca o arranque do novo ano hidrológico, que decorre entre 1 de outubro e 30 de setembro, numa altura em que os níveis de armazenamento são tradicionalmente mais baixos. Nesta altura, o volume de armazenamento cifra-se em 75%, com um decréscimo de 0,83% entre 15 e 22 de setembro.

Embora a maioria das bacias ainda se situe acima da média de armazenamento para setembro, considerando o período de referência 1990/91 a 2023/24, as exceções notam-se no Mondego (60,1%), na bacia do Mira (53,7%) e nas Ribeiras do Barlavento algarvio (46,0%). Estas regiões apresentam reservas abaixo da média, confirmando fragilidades estruturais que se repetem ano após ano e que colocam em risco tanto a agricultura como o abastecimento urbano. No caso do Algarve, a Barragem da Bravura é o exemplo mais emblemático: construída numa pequena ribeira, raramente atinge capacidade significativa e tem sido apontada como uma infraestrutura de reduzida eficácia no atual contexto de escassez.

Albufeiras mantêm níveis relativamente elevados de armazenamento, apesar de 3 albufeiras deterem valores inferiores à média.
Maioria das albufeiras mantém níveis acima da média de armazenamento para setembro, com exceção para o Mondego, Mira e Barlavento. Fonte: Relatório Semanal do SNIRH, APA.

O mês de setembro foi caracterizado por condições meteorológicas desfavoráveis para a recarga hídrica. Predominou o calor, a ausência de precipitação expressiva e episódios de instabilidade associados ao ex-furacão Gabrielle que, apesar de trazerem alguma chuva localizada, não foram suficientes para inverter a tendência de esvaziamento. Em várias regiões do país, especialmente no Sul e no interior, as fontes naturais e linhas de água registaram caudais muito baixos, traduzindo a pressão crescente sobre as reservas armazenadas em albufeiras.

A situação é particularmente preocupante porque as previsões sazonais não antecipam melhorias significativas a curto prazo. O modelo europeu ECMWF indica que a primeira quinzena de outubro será marcada por temperaturas acima da média em grande parte do território, com anomalias positivas mais acentuadas na Beira Baixa e no Alto Alentejo, onde os valores poderão superar em 2 a 3 graus Celsius os registos normais para esta época.

Mesmo no litoral, as temperaturas deverão manter-se ligeiramente acima da média, pelo menos até meados do mês. Este calor adicional traduz-se em maior evaporação das superfícies hídricas e aumento da procura de água, agravando a pressão sobre um sistema que inicia o outono já fragilizado.

O que é necessário fazer para atenuar os efeitos de rutura das barragens em Portugal? E como será outubro?

No que respeita à precipitação, o cenário é igualmente pouco animador. Os mapas de anomalia do ECMWF sugerem que outubro poderá ser mais seco do que o habitual em grande parte de Portugal continental e na Madeira. Apenas nos Açores, sobretudo no Grupo Central, existe sinal de anomalias positivas de precipitação, com previsões de 5 a 20 milímetros acima do normal. No continente, o padrão atmosférico esperado, dominado por fases de bloqueio anticiclónico e pela fase positiva do índice NAO, tende a inibir a entrada regular de depressões atlânticas e das suas frentes associadas, atrasando o início de um verdadeiro período de recarga das barragens.

Apesar desta previsão, outubro é tradicionalmente um mês marcado por elevada variabilidade meteorológica. Historicamente, grandes tempestades e episódios de precipitação intensa têm ocorrido nesta altura do ano, como a depressão Elsa em 2019 ou as chuvas abundantes de outubro de 2023. Assim, mesmo que a tendência dominante seja de tempo mais seco, não se pode excluir a possibilidade de episódios pontuais de chuva forte capazes de alterar localmente o cenário de armazenamento. Porém, a irregularidade destas ocorrências limita a sua contribuição para uma recuperação estável e generalizada das reservas.

Num quadro em que a procura continua a aumentar, sobretudo pela pressão agrícola do regadio intensivo, especialistas em gestão da água alertam para a necessidade urgente de limitar consumos e investir em soluções que privilegiem a eficiência. De facto, várias evidências científicas denotam que país já não dispõe de margem para aumentar a oferta através de novas barragens, sendo fundamental atuar sobre a procura. Para o efeito, permitir a expansão do regadio em regiões como o Algarve deve ser limitada, já que mesmo a água proveniente do Alqueva não pode chegar a todo o lado.

A gestão das perdas nas redes de abastecimento urbano é outro ponto crítico. Em alguns sistemas de distribuição, as perdas situam-se entre 40% e 50%, valor que compromete qualquer apelo à poupança doméstica. Investimentos em modernização e monitorização destas redes são vistos como passos indispensáveis para reduzir desperdícios e aumentar a resiliência dos sistemas urbanos de abastecimento.