O "som do Big Bang" revela uma possível solução para o maior mistério do Universo

Os cientistas propõem que a Terra poderia estar localizada dentro de uma gigantesca região vazia, uma hipótese que resolveria uma das maiores controvérsias da cosmologia moderna e repensaria o que sabemos sobre o Universo.

O Big Bang é considerado o início do Universo.

Em 1929, Edwin Hubble descobriu que o Universo está em expansão. No entanto, hoje essa expansão representa um mistério, pois o cosmos parece estar a crescer mais rapidamente perto de nós do que em regiões distantes. Conhecida como "Tensão de Hubble", esta discrepância intriga os cientistas e desafia teorias bem estabelecidas.

Embora os dados do satélite Planck mostrem uma expansão mais lenta do Universo primitivo, as observações de supernovas próximas revelam uma diferença de quase 10%, o suficiente para questionar a solidez do modelo cosmológico atual. As medições estão erradas ou falta uma peça fundamental na teoria?

Em julho de 2025, investigadores da Universidade de Portsmouth propuseram uma solução ousada, sugerindo que vivemos dentro de uma "bolha" de baixa densidade. De acordo com o Dr. Indranil Banik, isso explicaria por que razão as galáxias próximas estão a afastar-se mais rapidamente do que o esperado.

O Universo em grande escala apresenta várias zonas “vazias”.

Se este cenário for real, o problema não está nos dados, mas na nossa forma de observar. Seria como estar num vale rodeado por colinas — tudo parece mais inclinado do que realmente é. Da nossa posição na galáxia, é difícil mudar de perspetiva.

Ecos do Big Bang

Para testar esta hipótese, os cosmólogos utilizaram algo chamado Oscilações Acústicas de Baryon (BAO), ecos do Big Bang preservados na matéria do Universo. São como ondas que atuam como uma régua cósmica, permitindo medições precisas de distância e estrutura, revelando a estrutura profunda do cosmos.

O BAO mostra que a matéria não está distribuída uniformemente em grandes escalas. À nossa volta, há menos galáxias do que o esperado, o que corrobora a existência de um vazio local. Dados recentes indicam que este modelo é 100 milhões de vezes mais provável do que o tradicional.

A atração gravitacional das zonas exteriores atrai a matéria para fora, acelerando o seu movimento. Este fluxo aumenta o desvio para o vermelho das galáxias próximas, simulando uma expansão acelerada. Assim, a aparente contradição entre as medições locais e distantes encontra uma ponte coerente.

Se confirmada, esta hipótese não só resolveria a tensão de Hubble, como também reabriria uma velha questão: Será que ocupamos um lugar “especial” no cosmos? Um conceito que a ciência tem evitado desde a revolução copernicana, quando aprendemos que não somos o centro de nada.

Vazios gigantes: limites da física atual

Um vazio com um raio de mil milhões de anos-luz desafia o princípio cosmológico, que afirma que o Universo é homogéneo em grandes escalas. A provar-se a sua veracidade, o modelo ΛCDM - a base da cosmologia moderna - necessitaria de ajustes para dar conta desta inesperada assimetria.

O modelo ΛCDM, também conhecido como modelo cosmológico padrão, é a descrição mais amplamente aceite da evolução e estrutura do Universo. Ele incorpora a energia escura (representada por Lambda, Λ) e a matéria escura fria (CDM).

Alguns especialistas argumentam que estruturas de tal magnitude são improváveis com base em simulações de matéria escura. Num futuro próximo, telescópios como o Euclid e o Vera Rubin poderão fornecer provas de apoio, mapeando a distribuição das galáxias com um pormenor sem precedentes.

Diagrama que mostra o que se sabe sobre o Big Bang e a expansão do Universo.

Entretanto, teorias alternativas estão a ganhar força. A ideia da energia escura primitiva sugere que uma força desconhecida alterou a expansão do Universo quando este ainda estava a dar os primeiros passos. No entanto, o vazio local destaca-se pela sua simplicidade em ajustar os dados sem adicionar variáveis complexas.

O debate põe em evidência um princípio fundamental da ciência: todas as teorias devem estar em conformidade com as provas. Tal como Copérnico reformulou a nossa visão do sistema solar, a descoberta de uma bolha cósmica poderá marcar um novo capítulo na cosmologia moderna.

Olhando para o futuro: perguntas e descobertas futuras

Para confirmar esta teoria, os astrónomos planeiam comparar o modelo do vazio com os chamados relógios cósmicos - galáxias antigas cuja idade é determinada pela ausência de estrelas jovens. Se as suas idades se alinharem com as previsões, o modelo do vazio ganhará um forte apoio.

Outra pista fundamental reside nos fluxos de matéria em grande escala. Se vivemos num vazio, deveria haver um deslocamento maciço de galáxias em direção às margens da bolha. Projetos como o LSST, no Chile, poderão detetar estes movimentos até ao final desta década.

Para além da abstração, compreender a expansão do Universo tem consequências no mundo real. Saber se o cosmos se vai expandir para sempre ou entrar em colapso informa teorias, inspira novas tecnologias e levanta questões filosóficas sobre o nosso lugar na vastidão.

Nesta viagem de descoberta, cada avanço lembra-nos que a nossa maior certeza é a nossa ignorância. Talvez, tal como no tempo de Galileu, estejamos à beira de ver a realidade com olhos renovados, expandindo os limites do que é visível - e possível.