Cientistas japoneses descobrem uma nova forma de “ouvir” os buracos negros
Uma equipa de físicos japoneses conseguiu calcular com precisão as vibrações dos buracos negros após uma colisão, revelando estruturas ocultas e espirais matemáticas que nunca tinham sido medidas antes.

Imagine que um buraco negro colide com outro e, apesar de não “ouvirmos” nada, todo o espaço-tempo vibra. Chamamos a estas ondas modos quasinormais, que são basicamente os ecos da perturbação, como sinos invisíveis que tocam brevemente antes de desaparecerem no nada.
Estes “ecos” e as suas frequências contêm informação chave sobre a massa, o tamanho e até a forma do buraco negro deixado para trás após o choque. Medir estes parâmetros é, em essência, ouvir a canção do abismo, mas calculá-los com precisão tem sido um desafio técnico.
Os mais difíceis são os modos altamente amortecidos, uma vez que se desvanecem rapidamente e, embora os detectores possam registar os mais fortes, a compreensão dos mais fracos exige fórmulas que atravessam delicadas fronteiras matemáticas. É aqui que entra uma ferramenta poderosa mas pouco utilizada na física: o método WKB exato.
Um grupo de investigadores japoneses liderado por Taiga Miyachi decidiu aplicar este método ao estudo dos buracos negros e o que descobriram foi surpreendente: padrões espirais escondidos, cortes invisíveis na matemática do horizonte e uma nova forma de seguir as ondas que emergem da escuridão para o infinito.

Com esta técnica, foram capazes de traçar com precisão as vibrações do espaço-tempo desde o horizonte do buraco negro até regiões distantes, resolvendo estruturas que antes eram inalcançáveis. Além disso, conseguiram fazê-lo sem recorrer a simulações numéricas; apenas papel e lápis e muita matemática complexa.
O que é o método WKB (e porque é que é tão especial)?
É uma técnica que teve origem na mecânica quântica para resolver equações complexas sem conhecer a sua solução exata. A sua versão “exacta” permite também estender estas soluções ao plano complexo, revelando comportamentos que passam despercebidos nos métodos tradicionais.
Ao contrário de outras abordagens, a WKB exacta não necessita de fechar contornos arbitrários nem de assumir limites extremos, podendo trabalhar diretamente sobre a linha real. De seguida, são analisadas as soluções globais das equações diferenciais, o que constitui um passo fundamental na descrição das vibrações espaço-temporais.
Um dos conceitos centrais são as curvas de Stokes, os limites invisíveis onde a natureza de uma onda muda abruptamente, e descobre-se que estas curvas não são simples linhas mas podem formar espirais logarítmicas infinitas que emergem do horizonte do buraco negro.
Estas espirais tinham sido ignoradas por muitos estudos anteriores. No entanto, foram fundamentais para compreender como as soluções próximas do buraco negro se ligam às que descrevem o espaço distante porque são, de certa forma, os caminhos ao longo dos quais os ecos gravitacionais viajam.
Uma sinfonia matemática numa espiral
Ao aplicar o método WKB exato a um buraco negro de Schwarzschild, os investigadores descobriram uma estrutura rica e precisa nos modos quasinormais- de facto, os modos mais fracos e amortecidos, anteriormente difíceis de prever, puderam ser elegantemente calculados.
Para validar a sua abordagem, começaram por testar o método em modelos simples, como o oscilador harmónico e o potencial de Morse, sistemas que, embora clássicos, têm semelhanças estruturais com as equações do espaço-tempo em torno de um buraco negro.

A grande descoberta foi que o comportamento das curvas de Stokes em torno dos pontos singulares do espaço-tempo influencia diretamente as frequências de eco. Assim, ao ter em conta estas espirais matemáticas, a equipa foi capaz de afinar as condições de fronteira necessárias.
Ao fazê-lo, não só resolveram modelos exactos, como abriram a porta ao cálculo das frequências reais emitidas por um buraco negro após uma fusão. Algo como uma sinfonia matemática que, até agora, tínhamos ouvido mas não sabíamos a partitura.
O Universo assina com um eco
Este avanço não é apenas teórico, porque as ondas gravitacionais detetadas por observatórios como o LIGO ou o KAGRA poderiam ser analisadas com maior precisão se compreendêssemos melhor as suas componentes mais subtis, e é exatamente isso que esta nova formulação matemática permite.
Cada modo quasinormal é como uma nota na canção do Universo. Saber interpretá-los, como o faria uma orquestra cósmica, poderia revelar se um objeto observado é um buraco negro clássico ou algo mais exótico, como uma estrela bosónica ou um remanescente quântico ainda desconhecido.
A equipa planeia agora alargar a sua análise a buracos negros rotativos ou de Kerr, onde a geometria é ainda mais complexa, e explorar a forma como este método pode ser aplicado a teorias para além da relatividade geral, incluindo possíveis efeitos quânticos na gravidade.
Este trabalho não só resolve um problema antigo, como abre uma nova via para escutar com atenção e rigor os segredos mais profundos do Universo, porque, por vezes, o que parece ser um silêncio absoluto esconde o eco mais revelador.
Referência da notícia
Path to an exact WKB analysis of black hole quasinormal modes. Taiga Miyachi, Ryo Namba, Hidetoshi Omiya, Naritaka Oshita. Phys. Rev. D 111, 124045. Published 24 June, 2025.