O fundo do mar Ártico está a prosperar: o que significa isto?

Os investigadores encontraram fitoplâncton escondido no fundo do mar Ártico, que pode dar lugar a uma cascata de efeitos sobre a ecologia local e o ciclo do carbono. Saiba mais aqui!

região ártica
Muitas áreas que costumavam estar cobertas de gelo durante todo o ano estão agora sem gelo no verão.

Todos os anos, na primavera, o Oceano Ártico floresce. Em vez de flores, as águas superficiais são inundadas por algas microscópicas. Após a floração ter esgotado os nutrientes à superfície, este plâncton afunda-se no fundo do mar e, sem luz, morre ou permanece num estado estável.

Pelo menos, era o que os cientistas pensavam. Um novo estudo publicado na Global Change Biology, revelou que, no verão, o fitoplâncton poderia florescer no fundo do mar Ártico.

No verão de 2016, Takuhei Shiozaki, coautor do estudo e investigador da Universidade de Tóquio, estava a bordo de um cruzeiro científico que conduzia investigações no Ártico. Ao recolher amostras e medições de rotina no Mar de Chukchi, Shiozaki e os seus colegas descobriram que em vez de estarem num estado estável com baixa produtividade, as algas em amostras de água do fundo do mar mostraram uma elevada produção primária, indicando uma floração.

O fitoplâncton prospera num oceano mais quente

Os efeitos das alterações climáticas são especialmente graves no Ártico, fazendo com que a região aqueça a uma velocidade quase 4 vezes superior à do resto do planeta. Muitas áreas marinhas que antes estavam cobertas de gelo durante todo o ano, estão agora sem gelo no verão.

Shiozaki e a sua equipa especularam que esta falta de gelo, juntamente com a água sazonalmente transparente e o aumento da quantidade de radiação solar absorvida (irradiação), permite que a luz solar chegue ao fundo do oceano em áreas pouco profundas, provocando o florescimento do fitoplâncton.

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Para apoiar esta hipótese, a equipa de investigação regressou ao Mar de Chukchi para recolher mais amostras. Foi realizada uma experiência de laboratório, recriando condições de temperatura e luz do fundo do mar, e incubando amostras de sedimentos durante 24 dias com água do mar filtrada para organismos. As algas microscópicas floresceram nas amostras, mesmo quando a irradiação era apenas 1% do que a que incide à superfície.

Lars Chresten Lund-Hansen, um investigador da Universidade de Aarhus, na Dinamarca, ficou surpreendido com os resultados e espera ter mais provas deste florescimento de algas. "Em vez de fazer experiências com o sedimento, seria interessante se a equipa pudesse, de alguma forma, conduzir uma experiência in situ, de maneira a garantir que estas algas estão realmente vivas", afirmou.

Uma cascata de implicações

Se de facto houver produção primária a decorrer no fundo do oceano, as implicações podem ser de grande alcance. Como o fitoplâncton constitui a base da teia alimentar no Ártico, as florações de fundo poderiam alterar o ecossistema - de acordo com os autores do Relatório Ártico de 2020, por exemplo, as florações de algas anteriormente documentadas contribuíram indiretamente para o aumento das populações de baleias com cabeça de proa.

Estas florescências ocultas poderiam também ter impacto no ciclo do carbono, uma vez que o fitoplâncton remove o carbono do ambiente, durante a fotossíntese.

O facto de o fitoplâncton estar a florescer no fundo do oceano, pode trazer alguns efeitos para o ecossistema envolvente. O estudo continuará, de forma a tentar obter um conhecimento mais abrangente sobre o tema.

O primeiro passo para uma maior compreensão destas algas é uma estimativa precisa de quão disseminados podem estar estes focos de florescência. Para chegar a tal estimativa, os cientistas modelaram a irradiação no fundo do mar com base em dados de satélite da região da plataforma ártica, onde muitas áreas são suficientemente rasas para suportar as florações. Os modelos mostraram que as florescências de fundo poderiam, teoricamente, ocorrer em quase um quarto da região.

A equipa de investigação espera obter uma compreensão mais precisa da distribuição real e do impacto das florações através da extensão das observações de campo a áreas adicionais, bem como através da colaboração com modeladores de ecossistemas.