Estratégia nacional vai combater a alga asiática que está a invadir a costa portuguesa
Governo criou grupo de trabalho para controlar a espécie exótica, que afeta a biodiversidade, a pesca e o turismo, mas academia e municípios já estão no terreno, tentando erradicar a praga que veio do Pacífico.

A Rugulopteryx okamurae, espécie exótica de origem asiática, tem vindo a alastrar-se rapidamente na costa portuguesa, atingindo com particular gravidade as praias dos Açores, do Algarve e de Cascais.
Com o intuito de controlar a sua proliferação, os ministérios da Agricultura e do Ambiente incumbiram a Agência Portuguesa do Ambiente a tarefa de coordenar um grupo de trabalho onde estão representadas instituições científicas, autarquias e entidades ligadas ao setor do mar. As várias partes envolvidas vão articular esforços e recursos com vista a monitorizar, controlar e remover a macroalga, que chegou a Portugal em 2019.
A rota marítima de Marselha até aos Açores
Com origem no oceano Pacífico (Filipinas, China, Coreia e Japão), a Rugulopteryx okamurae foi detetada na Europa em 2009, em Marselha, no Sul de França, mas não suscitou grandes preocupações. A alga não manifestou uma ação invasora nesse território, coabitando com as espécies nativas da região sem comprometer o seu desenvolvimento.

O alarme suou quando, em 2015, atingiu estreito de Gibraltar e a costa da Andaluzia, em Espanha, proliferando rapidamente entre Tarifa e Algeciras. O crescimento descontrolado e a quantidade de biomassa gerada resultaram também em milhares de toneladas acumuladas nas praias e zonas costeiras, causando um odor intenso, que afastou os banhistas e afetou significativamente o turismo.
Uma alga que viaja nos cascos dos barcos
Em inícios de 2019, a Rugulopteryx okamurae chegou aos Açores, cobrindo em apenas um ano todo o fundo marinho rochoso da costa sul da Ilha de São Miguel. No seu artigo “A alga silenciosa chega aos Açores”, João Faria, biólogo marinho do polo açoriano do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (Cibio-Açores), explica que a espécie consegue fixar-se no casco das embarcações e nas redes de pesca, podendo viajar longas distâncias através do tráfego marítimo.
Terão sido, como tal, as embarcações piscatórias o veículo mais provável que levou a alga invasora até costa algarvia, em inícios de 2022. Nesse mesmo ano, aliás, a planta foi incluída na lista de espécies exóticas invasoras da União Europeia.

A costa de Cascais é agora o destino mais recente destas algas, tendo chegado em 2024 à zona balnear entre a Praia das Moitas e a Praia da Rainha. A sua presença alastrou-se por várias outras estâncias, onde só este ano foram retiradas 400 toneladas de biomassa com a ajuda de máquinas e do trabalho voluntário.
Várias universidades portuguesas estão atentas ao fenómeno, procurando investigar o que está na origem da invasão, bem como formas eficazes de a controlar. O Cibio-Açores está a estudar porque é que esta alga, fora do seu habitat nativo, ganha uma capacidade de reprodução exponencial. Várias hipóteses estão em cima da mesa.

A causa poderá estar ligada a alterações genéticas ou moleculares da planta, mas é possível também que as temperaturas e a salinidade das águas no estreito de Gibraltar tenham propiciado a sua expansão. Não será de se descartar ainda que um ecossistema já vulnerável a outras invasões biológicas tenha acelerado este processo.
O Observatório Marinho do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve está, por seu turno, a recorrer a tecnologias satélite, procurando localizar os volumes de algas no alto-mar para prever a sua trajetória até à costa.
Os investigadores do Algarve estão também a trabalhar na construção de barreiras, tentando desviar a espécie para outros locais. Esperam ainda testar, no decorrer deste ano, um sistema de semáforo (verde, amarelo e vermelho) que irá antecipar as medidas a tomar antes da chegada da alga às praias da região algarvia.

A plataforma Algas na Praia é um outro projeto, lançado há três anos, que permite aos banhistas partilhar fotos e informações sobre as algas que avistam (como cor ou quantidade). Os dados recebidos são analisados pelos investigadores, podendo contribuir para futuros estudos.
O município de Cascais tem uma iniciativa semelhante com uma campanha de monitorização da espécie, que apela aos banhistas para relatar e documentar a sua presença através do formulário online Alga invasora em Cascais - Rugulopteryx okamurae.
Um plano abrangente para combater os impactos
A Estratégia Nacional deverá agora articular todo esse trabalho que já está a ser desenvolvido pela academia e pelos municípios, procurando definir um plano mais abrangente para mitigar os impactos ecológicos, sociais e económicos desta macroalga invasora.
O plano prevê ainda que a academia, as autarquias e o setor empresarial possam trabalhar em conjunto, estudando soluções biotecnológicas para valorizar a biomassa gerada com o crescimento desenfreado da alga.

Esse é precisamente o intuito da parceria entre a startup OffKelp, a Câmara Municipal de Cascais, o Instituto Superior de Agronomia da Universidade de Lisboa e a Vivid farms. O piloto do consórcio, denominado ReAlga, está a estudar a viabilidade da Rugulopteryx okamurae como bioestimulante para culturas agrícolas, como a vinha e as hortas.
A Rugulopteryx okamurae coloca grandes desafios que têm de ser ultrapassados sem mais perdas de tempo. A sua presença compromete a biodiversidade marinha, o turismo e a pesca, mas também representa uma oportunidade para as indústrias, com potencial para neutralizar os efeitos ambientais e reduzir os impactos económicos e sociais.
Referências da notícia
Governo aprova estratégia nacional de combate a alga invasora. Portugal.gov.pt
João Faria. Rugulopteryx okamurae: – A alga “silenciosa” chega aos Açores. Açores Magazine
Plataforma Algas na Praia- Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve
Formulário Alga invasora em Cascais. Município de Cascais