E se aproveitássemos a sabedoria ancestral para alcançar a eficiência energética?
A solução para casas frescas no verão e quentes no inverno está, afinal, nos telhados antigos do Sul de Itália. Saiba aqui como o conhecimento dos nossos antepassados foi finalmente validado pelas leis da física.

Aproveitando uma viagem de trabalho em Benevento, a pouco mais de 60 km de Nápoles, Adrian Bejan, professor de Engenharia Mecânica na Duke University, nos Estados Unidos, decidiu visitar o centro histórico desta cidade italiana milenar ainda pouco conhecida, mesmo entre os turistas europeus.
Ao percorrer as ruas medievais, reparou que os telhados das casas eram todos iguais. Não foi algo que o surpreendesse. Nas outras cidades históricas que já tinha visitado, as coberturas dos edifícios apresentavam características semelhantes. Mas foi enquanto passeava sem destino certo pelas praças e ruelas estreitas de Benevento que perguntou a si próprio:
As formas repetidas não podiam ser apenas uma mera questão estética. Sendo Adrian Bejan um conceituado especialista em termodinâmica e no movimento e fluxo de calor, a dúvida não iria ficar sem resposta.
Sentado numa esplanada e aproveitando o sol da manhã, rabiscou em guardanapos alguns cálculos. Com as primeiras equações feitas, regressou aos Estados Unidos e pediu ajuda ao seu colega Pezhman Mardanpour, também ele professor de engenharia mecânica e de materiais na Florida International University.

Ambos analisaram as medições aplicadas em dois formatos comuns nos tetos do casario de Benevento - um telhado comprido com uma secção transversal triangular e um cone circular.
A simplicidade das soluções tradicionais
Os resultados do trabalho foram agora publicados na revista International Communications of Heat and Mass Transfer. O estudo de Adrian Bejan e de Pezhman Mardanpour mostra que a geometria dos telhados usada na arquitetura tradicional de Benevento não é acidental.
Apesar de desconhecerem os princípios elementares da eficiência energética, os antigos construtores sabiam o que estavam a fazer. Não aplicaram equações nem usaram fórmulas que hoje podem ser alcançadas com as leis da física.
A investigação de Bejan e Mardanpour mostra que, alterando apenas a forma do telhado, é possível melhorar a eficiência energética sem custos adicionais nem recurso a tecnologia.
As bolsas de ar aprisionadas pelos diferentes formatos dos telhados funcionavam como bons isolantes numa época em que a otimização da energia das habitações era uma questão de sobrevivência.
O estudo valoriza o conhecimento empírico acumulado pelas culturas tradicionais. Durante séculos, os construtores perceberam que certos desenhos tornavam as casas mais frescas no verão e mais quentes no inverno.

As linhas altas ou baixas de um telhado determinam como o ar irá se comportar no interior de uma habitação. Se um pico num cone circular ou em forma de A tiver menos de um metro de altura, o vento fluirá uniformemente, como a água a escorrer pela lateral de um lavatório.
A largura também tem, naturalmente, um impacto direto nos fluxos de ar e na transferência de calor. Se o pico do telhado tiver menos de um metro de altura, o teto deverá ser três ou quatro vezes mais largo do que alto para minimizar a perda de calor. Mas, se tiver mais de 90 cm de altura, terá de ser um triângulo equilátero com uma relação altura/largura de um.
O conhecimento puramente empírico, agora confirmado finalmente pelas leis da física, não é apenas um reconhecimento justo da sabedoria dos nossos antepassados. Mais importante ainda – defendem os autores – será a sua furura aplicação nas construções contemporâneas.
Velhos conceitos com novas aplicações
Além da habitação, os seus princípios podem ser usados no design de veículos, melhorando a dissipação térmica, na arquitetura bioclimática, em regiões com climas extremos, ou na Biomimética, área disciplinar que busca inspiração na natureza para desenvolver soluções tecnológicas ou de design.
Adrian Bejan e Pezhman Mardanpour estão convencidos de que, se os novos edifícios incorporarem estes princípios, será possível diminuir significativamente a necessidade de aquecimento ou arrefecimento artificial.

Ao aproveitar melhor a energia consegue-se também reduzir a pegada de carbono do setor da construção, além de democratizar o acesso a habitações sustentáveis, mesmo em regiões com menos recursos.
O que a sabedoria milenar demonstra com este caso em particular é que aliar a ciência à tradição pode ser o melhor caminho para promover uma arquitetura mais consciente do ambiente sem comprometer a estética, a função e a eficiência.
Referência da notícia
A. Bejan, P. Mardanpour. Why people shape roofs the same way? International Communications in Heat and Mass Transfer.