Xylella fastidiosa: Universidade de Coimbra identifica, pela primeira vez em Portugal, várias estirpes da bactéria

A Xylella fastidiosa foi detetada pela primeira vez na Europa em 2013 e, em Portugal, em 2019. Representa um elevado risco para a agricultura, podendo afetar mais de 700 espécies, incluindo as videiras, oliveiras, amendoeiras, pomares de citrinos e outras culturas.

Amendoeira queimada pela bactéria Xylella fastidiosa
A bactéria Xylella fastidiosa pode afetar mais de 700 espécies, incluindo as videiras, oliveiras, amendoeiras, pomares de citrinos e outras culturas com grande valor económico.

A bactéria Xylella fastidiosa, que é transmitida de forma natural através de insetos vetores, através do comércio de plantas infetadas e pela enxertia de plantas contaminadas, tem o poder de colonizar os vasos condutores da seiva das plantas, acabando por matá-las. Pode afetar mais de 700 espécies, incluindo as videiras, oliveiras, amendoeiras, pomares de citrinos e outras culturas com grande valor económico.

Quando aparece, esta bactéria atua bloqueando os vasos xilémicos dos hospedeiros, dificultando a absorção de água e nutrientes, o que provoca a murchidão, queimadura na zona marginal e apical das folhas das plantas, a morte de alguns ramos e, por fi­m, da totalidade da planta.

Uma investigação recente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) isolou, pela primeira vez em Portugal, várias estirpes da bactéria Xylella fastidiosa, associada à doença de Pierce, que apresenta um elevado risco para a agricultura nacional.

Este estudo revela a origem da introdução da bactéria e reforça a “necessidade de vigilância desta doença”, refere a FCTUC através de um comunicado.

Mais de 5,5 mil milhões de euros de prejuízos

A Xylella fastidiosa é considerada pela Comissão Europeia uma praga de quarentena prioritária, com impactos económicos estimados em mais de 5,5 mil milhões de euros por ano, na União Europeia.

Oliveira afetada pela bactéria Xylella fastidiosa
Quando aparece, a Xylella fastidiosa atua bloqueando os vasos xilémicos dos hospedeiros, dificultando a absorção de água e nutrientes, o que provoca a murchidão, queimadura na zona marginal e apical das folhas.

Desde a primeira deteção, em Apúlia, Itália, em 2013, a bactéria já está presente em quase duas dezenas de áreas demarcadas em Portugal, sobretudo nas regiões Norte e Centro. Agora, um grupo de investigadores da FCTUC isolou, pela primeira vez em território nacional, a subespécie fastidiosa ST1.

Joana Costa, coordenadora do projeto XylOut e investigadora do Centro de Ecologia Funcional (CFE) e do Departamento de Ciências da Vida (DCV) da FCTUC, não tem dúvidas de que este é “um contributo científico crucial para compreender o risco real da presença da bactéria em Portugal. A estirpe que identificámos, pertencente ao ST1, é um tipo genético específico, que está associada a doenças graves em vinhas na Califórnia. A sua presença levanta preocupações para o futuro das culturas portuguesas”.

O grupo de investigação da Universidade de Coimbra revela ainda que as estirpes foram isoladas na região da Cova da Beira, uma das principais zonas fruteiras do país, e que os resultados genómicos sugerem uma única introdução da bactéria em Portugal, com origem genética associada à Califórnia.

Inseto
A bactéria Xylella fastidiosa é transmitida de forma natural através de insetos vetores, através do comércio de plantas infetadas e da enxertia de plantas contaminadas.

“As plantas afetadas incluem espécies cultivadas e silvestres, o que reforça a importância da vegetação espontânea como possível reservatório da bactéria”, avançam os investigadores.

A coordenadora do projeto XylOut afirma ainda que, “apesar do estudo indicar uma única introdução da bactéria em Portugal com origem na Califórnia, a investigação prossegue, no sentido de desvendar um 'hiato temporal' (entre 3 e 23 anos) na história da estirpe no nosso país”.

Para Joana Costa, isto significa que “a sua data precisa de introdução e dispersão inicial, ainda está por determinar”, embora a equipa já esteja “a trabalhar numa nova campanha de amostragens, alargando as áreas de estudo e focando-se noutras áreas demarcadas”.

Ultrapassar barreiras legais e técnicas

Esta investigação decorreu no FITOLAB – Laboratório de Fitopatologia, do Instituto Pedro Nunes (IPN), o primeiro, em Portugal, acreditado para a deteção de Xylella fastidiosa e reconhecido pela Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) como Laboratório Oficial.

O FITOLAB é dirigido por Joana Costa e António Portugal e é considerado “um exemplo” da ligação estratégica entre a FCTUC e o IPN.

Essa ligação estreita entre a FCTUC e o IPN “permitiu não só ultrapassar as barreiras legais e técnicas associadas ao estudo desta bactéria de quarentena, como garantir que os avanços da investigação fundamental chegam à interface com o setor agrícola, promovendo soluções aplicáveis em contexto real”, refere a Universidade de Coimbra.


O grupo de investigação responsável por este estudo entende que este contributo genético representa “um avanço decisivo no reforço da vigilância e no planeamento de estratégias eficazes de contenção” da bactéria Xylella fastidiosa em Portugal.

O trabalho foi desenvolvido no âmbito do doutoramento de Eva Garcia (Programa Doutoral em Biociências da UC), em colaboração com o Centro de Citricultura do Instituto Agronômico de Campinas (Brasil) e a Universidade da Califórnia, Berkeley (EUA).

O artigo científico “Isolation, Phylogenetic Inferences, and Early Diversification of Xylella fastidiosa subsp. fastidiosa in Cova da Beira Region, Portugal” está publicado na revista científica Phytopathology e pode ser consultado aqui.