Tubarões do Atlântico ajudam os cientistas a antecipar a chegada de furacões
Projeto-piloto da Universidade de Delaware, nos Estados Unidos, está a usar a espécie para prever com maior antecedência a trajetória e a intensidade destas tempestades.

Na eterna batalha entre a ciência e natureza, os cientistas já conseguem prever a trajetória e a intensidade de um furacão. O difícil é antecipar a sua chegada em tempo útil, dando às populações costeiras mais hipóteses de se protegerem. Desconfiando que muitas destas respostas estão nas profundezas do mar, um grupo de investigadores da Universidade do Delaware, nos Estados Unidos, decidiu pedir ajuda a um aliado improvável – os tubarões.
Recorrer aos animais marinhos não é inédito, sendo, aliás, bastante comum no Ártico. Os cientistas usam marcadores de condutividade, temperatura e profundidade em focas para obter dados oceanográficos sobre uma vasta área do mar. Mas, nas zonas temperadas, é muito mais complicado encontrar animais aquáticos que respiram fora de água.
O intuito é usar sensores em tubarões para que possam prever com maior precisão a formação e a intensidade dos furacões na costa atlântica. O piloto está a decorrer com três espécimes - dois tubarões-mako e tubarão-branco - que já estão a explorar as águas quentes do Atlântico equipados com estes marcadores. Sempre que vêm à superfície, enviam dados em tempo real via satélite sobre condutividade, temperatura e profundidade da água.
Limitações da tecnologia
Atualmente, os meteorologistas conseguem prever a trajetória de um furacão com até cinco dias de antecedência, utilizando satélites meteorológicos, que não vão além da superfície do oceano - e veículos subaquáticos autónomos, conhecidos como gliders, com um raio de ação limitado.

Já os tubarões, além de nadarem com estilo, são mais rápidos, cobrem áreas maiores e não exigem manutenção. A espécie consegue sentir as mudanças na pressão barométrica e antecipar a chegada de uma tempestade mesmo a uma distância de até 160 km, alargando o período de alerta até duas semanas de antecedência.
Capacidades únicas
Embora as respostas variem de acordo com a espécie, os tubarões possuem capacidades biológicas únicas que lhes permitem detetar e reagir à aproximação de tempestades. Através de um ouvido interno ultrassensível e um sistema sensorial característico dos peixes – denominado de linha lateral -, estes animais conseguem reconhecer alterações na pressão atmosférica.
Estudos conduzidos na Universidade de Delaware mostraram, por exemplo, que em 2017 os tubarões-lixa, os tubarões-touro e os tubarões-martelo fugiram do furacão Irma muito antes de chegar à Baía de Biscayne, na Florida.
Algumas espécies maiores e mais robustas, por outro lado, podem ter uma reação oposta. O estudo mostrou que, durante o furacão Matthew (uma tempestade de categoria 5 em 2016), os tubarões-tigre não só se mantiveram na área, indo para águas mais profundas, como o seu número duplicou nos dias seguintes.
Os especialistas colocam a hipótese deste comportamento estar ligado ao grande número de peixes mortos pela tempestade que acabam por ser capturados pela espécie.
Águas estratificadas
Se o piloto da Universidade de Delaware for bem-sucedido, a ideia é recrutar cada vez mais tubarões e aumentar o acervo de dados sobre o mar. O plano é marcar dezenas de animais por ano e utilizar os dados que vão fornecer para construir modelos computacionais de previsão de furacões.

Os investigadores estão particularmente interessados nas zonas mais frias do mar. Durante os meses quentes do ano, a água do oceano é como uma lasanha com camadas estratificadas – a água quente fica à superfície e a água fria desloca-se para o fundo, podendo acelerar ou travar a intensidade de um furacão.
Resta saber onde estão estas zonas frias e esta é precisamente uma das respostas que os investigadores de Delaware esperam que os tubarões tragam quando vierem à superfície. Se estas criatura revelarem por onde andam estas águas, os meteorologistas poderão avaliar com maior rigor se um furacão atingirá a costa com uma força destruidora ou apenas como uma tempestade moderada.
A expectativa é, portanto, que os tubarões, ajudem os cientistas não só através do seu comportamento, mas monitorizando também as condições estratificadas na água, passando a ser, além de temidos predadores de topo, os olhos e os ouvidos da ciência.
Referência do artigo
Adam Thomas. Shark scientists. University of Delaware