Sul da África Ocidental registou uma onda de calor húmido invulgarmente intensa no início da estação seca, revela estudo

Temperaturas atipicamente altas e humidade relativa acima do comum foram os ingredientes de uma onda calor húmido na região do Golfo da Guiné em fevereiro deste ano. As conclusões constam um estudo do Imperial College London. Conheça aqui os detalhes!

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A região do Golfo da Guiné viveu em fevereiro de 2024 uma onda de calor húmido insólita.

A temperatura do ar à superfície em todo o mundo em fevereiro atingiu um máximo recorde, o mais quente dos 175 anos de registos climáticos globais da National Oceanic and Atmospheric Administration dos EUA (NOAA).

A área costeira meridional da África Ocidental, também conhecida como Golfo da Guiné é um exemplo prático disso, tendo-se aqui registado, no passado mês de fevereiro, um anormal calor extremo anormal por vários dias. A temperatura média nesta região alcançou também ela um recorde, superando a média do mês do período 1991-2020 em 0,40 ºC.

Esta região marca o limite sul do Oceano Atlântico Norte, distinguindo-se pelo seu clima com precipitação média anual variando de 1250 a 1500 mm, com o pico da temperatura máxima do ar a ocorrer nos meses de fevereiro e março, enquanto a humidade relativa é maior entre maio e novembro.

Apresenta um clima quente e húmido, que fazem desta uma região suscetível a ondas de calor, representando riscos tanto para a saúde como para os ecossistemas naturais.

As ondas de calor húmidas são conhecidas por serem particularmente perigosas, sendo são frequentemente apelidadas de “assassinas silenciosas”. Fatores fisiológicos, como idade e condições de saúde ajudam a construir a vulnerabilidade ao calor extremo.

Assim, estes fenómenos têm impactes especialmente significativos em determinados grupos, tais como, idosos e crianças, ou pessoas com doenças crónicas (nomeadamente saúde respiratória, cardiovascular, renal, vascular cerebral e/ou mental). A exposição é também ela um importantíssimo fator.

A deficiência generalizada de energia e o acesso limitado a água, saneamento, higiene e a serviços de saúde agravam a situação das populações da África Ocidental.

Em fevereiro, a região do Golfo da Guiné foi atingida por uma onda de calor húmida invulgarmente intensa no início da estação seca, com temperaturas normalmente não observadas até março ou abril. O calor mais intenso ocorreu de 11 a 15 de fevereiro com temperaturas registadas acima de 40 °C.

Uma combinação de altas temperaturas e ar relativamente húmido resultou em valores médios do Índice de Calor, equivalente à sensação térmica - que quantifica a perceção das temperaturas, levando em consideração a temperatura real do ar e a humidade relativa - de cerca de 50 °C, que é classificado pela NOAA como sendo no nível de “perigo”, e em alguns locais superiores a 60 ºC, classificado como “perigo extremo”, o mais alto de todos.

Embora as organizações meteorológicas no Gana e na Nigéria tenham emitido avisos à população, poucos impactes relacionados com o calor foram relatados pelos meios de comunicação social e pelas organizações governamentais em toda a região do Golfo da Guiné. Isto não significa que não tenham existindo impactes, mas sugere que existe uma limitada consciência sobre os riscos de calor extremo.

Na Nigéria foi relatado um aumento no número de pacientes que apresentavam doenças relacionadas com o calor, nomeadamente a falta de sono devido às noites quentes. Na Costa do Marfim, onde decorreu a Taça das Nações Africanas foram introduzidas paragens adicionais para hidratação, aos 30 e aos 75 minutos de cada jogo.

Influência das alterações climáticas?

Estas conclusões compõem um estudo publicado pelo Imperial College London, que revela um conjunto de dados preocupantes para este episódio de calor intenso, em particular, e para esta região do globo, em geral.

Devido às alterações climáticas induzidas pelo homem, o Índice de Calor médio da região é cerca de 4 °C mais elevado. Além disso, o calor húmido tornou-se muito mais provável, sendo pelo menos 10 vezes mais provável.

Com temperaturas médias globais de 1,40 °C acima dos níveis pré-industriais, prevê-se que o calor húmido, tal como o observado este ano, seja cerca de 1,2 °C a 3,4 °C mais quente e cerca de três a dez vezes mais provável. Estima-se que estes eventos ocorram, aproximadamente, uma vez a cada dois anos, ao contrário da tendência até aqui registada de um em cada dez anos.

A urbanização rápida e não planeada e que alberga cerca de metade dos habitantes da regiões, e que, em grande parte, vivem em habitações informais, torna uma parte considerável da população da região altamente suscetível e vulnerável ao calor extremo.

A deficiência generalizada de energia e o acesso limitado a água, saneamento, higiene e a serviços de saúde agravam ainda mais os riscos para a saúde relacionados com o calor, uma vez que estas populações ficam com opções muito limitadas para estratégias de sobrevivência individuais.

A Organização das Nações Unidas estima que o custo da adaptação para os países em desenvolvimento está entre 212 mil milhões de dólares por ano até 2030, segundo o relatório Estado do Clima Global 2023. Contudo, os países ricos ainda não cumpriram as promessas que fizeram para ajudar os países em desenvolvimento a tornarem-se mais resilientes aos riscos crescentes das alterações climáticas.

Além disso, estes compromissos ficam drasticamente aquém do financiamento necessário. Em 2021/2022, a comunidade global gastou apenas 63 mil milhões de dólares para ajudar os países em desenvolvimento a adaptarem-se às alterações climáticas.

Para reduzir a morbilidade e mortalidade relacionadas com as ondas de calor na África Ocidental, há uma necessidade urgente de melhorar a monitorização e a investigação sobre os impactes associados a este risco, mas também de avisos às populações. Isto é especialmente urgente à medida que o planeta continua a aquecer, causando estádios de calor prolongados e mais quentes.

Referência da notícia:

Pinto, I., Odoulami, R., Abiodun Lawal, K., et. al. (2024). Dangerous humid heat in southern West Africa about 4°C hotter due to climate change. Imperial College London.