Edward Lorenz: conheça a história do meteorologista que descobriu o efeito borboleta

O investigador americano descobriu que, mudanças à escala de uma borboleta, no ponto inicial dos modelos climáticos, resultavam em tempestades violentas. A teoria revolucionou as ciências, como a biologia, a economia ou a física.

Retrato de Edward Lorenz exposto no Museu de Oregon
A teoria do efeito borboleta de Edward Lorenz revolucionou diferentes áreas das ciências exatas. Foto: Retrato de Edward Lorenz que se encontra no Museu de Oregon, www.AbodeofChaos.org, CC BY 2.0, via Flickr

Numa manhã invernosa de 1961, Edward Lorenz (1917-2008), professor do Massachusetts Institute of Technology (MIT), estava há horas entretido a introduzir sequências numéricas num programa de simulação meteorológica. O protótipo em que se encontrava a trabalhar baseava-se numa dezena de variáveis, que iriam determinar o estado do tempo para os meses seguintes.

Após correr o modelo, o meteorologista repetiu o procedimento, mas decidiu arredondar o valor 0,506127 para 0,506. Feita a troca, saiu da sala para ir buscar uma chávena de café. Ao regressar, sentou-se na cadeira, olhou para o computador e deu um pulo, diante da surpresa.

A alteração praticamente insignificante, introduzida minutos antes, teve um efeito dramático na previsão meteorológica.

A descoberta foi acidental, mas Edward Lorenz deu-se imediatamente conta de que estava perante algo extraordinário. Bastou mudar ligeiramente as condições iniciais da simulação para se deparar com uma enorme divergência nos resultados.

Atrator de Lorenz
O gráfico conhecido como atrator de Lorenz mostra como dois pontos de partida próximos podem divergir rapidamente um do outro. Imagem: Yapparina, CC0, via Wikimedia Commons

Será que o bater das asas de uma borboleta no Brasil pode desencadear um tornado no Texas?” – perguntou o investigador durante a apresentação do seu modelo no encontro da American Association for the Advancement of Science, realizado em 1972.

A analogia, segundo a qual atos isolados e aparentemente insignificantes podem desencadear perturbações no futuro, tão elegantemente ilustrada na metáfora de Lorenz, deixou os colegas e o público na audiência maravilhados.

A borboleta entendida como metáfora

Hoje, o efeito borboleta teorizado por Lorenz continua a povoar o imaginário da literatura e até da cultura pop, mas os especialistas advertem que a sua teoria não é para levar à letra.

É preciso não esquecer que a imagem do bater das asas da borboleta a provocar um tornado a milhares de quilómetros de distância sempre foi apresentada como uma metáfora.

Ao usar a borboleta, Edward Lorenz quis demonstrar como a meteorologia é o resultado de padrões atmosféricos aparentemente independentes, que podem alterar, num determinado momento, o ambiente.

Trata-se somente de uma forma criativa para ilustrar a sensibilidade a condições iniciais e a sua interligação com eventos inseridos em sistemas altamente complexos. Por isso, quando se diz que um leve sopro pode dar origem a um vendaval, o seu sentido é apenas figurado.

A imprevisibilidade na teoria do caos

O certo é que esta nova abordagem acabou por dar origem à teoria do caos. A tese defende que o acaso nada tem a ver com a evolução dos sistemas naturais. Ou seja, embora possam ser descritas com fórmulas matemáticas deterministas, podem ser totalmente imprevisíveis.

Os modelos de comportamento descritos como complexos são tão sensíveis às condições iniciais que, mesmo partindo de circunstâncias quase idênticas, podem evoluir para desfechos totalmente distintos.

No seu artigo “Atractor de Lorenz: Efeito Borboleta”, Fernanda Amélia Ferreira, professora de matemática e de estatística do Politécnico do Porto, recorre a uma interessante analogia para ilustrar o conceito de sensibilidade às condições iniciais.

Quando despejamos um saco de berlindes no chão, não fazemos ideia por onde se vão espalhar. E, por mais que se tente reproduzir as condições iniciais do lançamento, qualquer repetição da experiência não produzirá o mesmo efeito.

Este resultado deve-se à impossibilidade de avaliar todos os fatores que podem influenciar a experiência, como a posição do saco em relação ao chão, a distribuição dos berlindes dentro do saco, as pequenas irregularidades de cada berlinde e do chão, o movimento de despejo, entre outras variáveis.

O mesmo se aplica ao estado do tempo, uma vez que a atmosfera está intimamente relacionada com a temperatura, humidade, pressão, vento, entre outras variáveis, incluindo o simples bater de asas de uma borboleta.

Hoje, os cientistas usam o termo “caos determinístico” para relacionar a noção de ordem com a desordem – dois conceitos incompatíveis até Edward Lorenz uni-los na sua teoria.

Borboleta
Pequenas mudanças num sistema complexo podem conduzir a resultados drasticamente diferentes ao longo do tempo, como o bater de asas de uma borboleta, que teoricamente, pode causar um tornado num lugar distante. Imagem: Pixabay

A partir da teorização do efeito borboleta de Lorenz, os investigadores constataram que os sistemas caóticos – como a meteorologia, o crescimento demográfico de uma espécie, o fluxo do trânsito numa estrada ou as variáveis de taxa de juros nos mercados financeiros – podem gerar respostas caóticas únicas, mas interdependentes das condições iniciais ou de variações aleatórias e irregulares coexistentes.

Borboletas na ficção literária

A ideia de um efeito borboleta, antes de Edward Lorenz, não era totalmente estranha, sendo inclusive um tema apelativo para a ficção científica.

No conto A Sound of Thunder (1952), o escritor americano Ray Bradbury cria uma realidade alternativa a partir da morte de uma borboleta pré-histórica, vítima de caçadores de dinossauros que, numa viagem no tempo, aterram na Era Mesozoica.

Milhões de anos mais tarde, o acontecimento criou um efeito dominó capaz de alterar a língua inglesa, entre outros acontecimentos, como os resultados de uma eleição presidencial.

Também a novela de 1941, Storm, de George Roger Stewart – que a irmã de Edward Lorenz lhe ofereceu de presente quando decidiu estudar meteorologia – há uma personagem que lembra como um espiro de um homem na China poderia provocar uma tempestade de neve em Nova Iorque.

O conceito, portanto, era popular no universo da literatura, mas ninguém ainda o tinha demonstrado.

A revolução nas ciências exatas

O impacto do trabalho de Edward Lorenz vai muito além da meteorologia. As conclusões que retirou a partir do efeito borboleta revolucionaram diferentes áreas da ciência, da biologia, à economia, passando pela física.

Moisaco de imagens: engarrafamento no trânsito; cotações da bolsa; tornado; borboleta
Sistemas complexos, como a meteorologia, o fluxo do trânsito ou as variações dos mercados financeiros podem gerar respostas caóticas únicas, mas interdependentes das condições iniciais. Imagens: Pixabay

Ao demonstrar que certos sistemas deterministas apresentam limites formais de previsibilidade, o investigador americano lançou as bases para a teoria do caos, considerada por muitos como a terceira revolução científica do século XX, a seguir à teoria da relatividade e à física quântica.

Referências da notícia

Fernanda A. Ferreira. Atractor de Lorenz: Efeito Borboleta. Politécnico do Porto

Jamie L. Vernon. Understanding the Butterfly Effect. American Scientist

Allison Rauch. Butterfly effect - Chaos Theory. Britannica

Butterflies, Tornadoes, and Time Travel. APS – Advancing Physics