O dilema das marcas sustentáveis: o que dizem os consumidores versus o que realmente compram
Apesar de afirmarem preferir produtos éticos e ecológicos, os consumidores não priorizam a sustentabilidade nas decisões de compra. Um novo estudo revela que marcas dominantes continuam a investir pouco em práticas sustentáveis, enquanto marcas pequenas ganham terreno.

Nos últimos anos, a oferta de produtos de higiene pessoal com alegações ambientais e sociais tem crescido exponencialmente. Os termos como “cruelty-free”, “embalagem reciclável” ou “redução de emissões” tornaram-se frequentes nos rótulos de champôs, desodorizantes e cosméticos. No entanto, um estudo recente realizado em colaboração inter-institucional da Universidade de Stanford e da Universidade de Rochester revela que estes rótulos, embora abundantes, não são o principal fator de decisão dos consumidores no momento da compra.
Sustentabilidade nas prateleiras: o que os consumidores dizem não bate certo com o que compram
A investigação, baseada na análise de seis terabytes de dados de vendas entre 2012 e 2019, com particular incidência no mercado norte-americano, cobriu mais de 30 000 produtos de beleza e cuidados pessoais. Os autores cruzaram informação de vendas com os dados dos rótulos e identificaram que apenas um terço dos produtos fazia qualquer tipo de alegação de sustentabilidade. As mais comuns referem-se a não testagem em animais (28,6%) e ao uso de embalagens amigas do ambiente (13,7%). Menos de 3% referem compromissos com sustentabilidade ambiental ou responsabilidade social.
O contraste entre as preferências declaradas e o comportamento real é notório. Embora 78% dos inquiridos num inquérito de 2022 tenham afirmado que um estilo de vida sustentável era importante para o seu dia a dia, os dados de mercado mostram que a escolha dos produtos depende mais de atributos como o tamanho da embalagem, os ingredientes ou a notoriedade da marca. A sustentabilidade, afinal, é um critério secundário.

Contrariamente à perceção generalizada, os produtos com rótulos sustentáveis não são necessariamente mais caros. De facto, o estudo revela que estes produtos, na sua maioria, têm preços inferiores aos produtos sem alegações ecológicas, sobretudo quando comercializados por marcas grandes. Isto indica que os atributos sustentáveis não são o principal motor de diferenciação ou justificação de preços elevados.
Contudo, há exceções importantes. As marcas pequenas, muitas vezes designadas como fringe brands, têm vindo a conquistar quota de mercado graças ao seu posicionamento sustentável. Estas marcas, mais ágeis e com linhas de produtos reduzidas, conseguem alinhar integralmente a sua oferta com os valores éticos e ambientais defendidos. Os dados demonstram que, em 2012, detinham menos de 5% da quota de mercado de produtos sustentáveis. Já em 2019, esta proporção subiu para 20%.
Marcas pequenas ganham terreno. Gigantes apostam em estratégias discretas face ao ceticismo dos consumidores
O estudo também observa que os consumidores atribuem maior valor a produtos sustentáveis quando estes provêm de marcas que oferecem apenas este tipo de produtos, reforçando a perceção de autenticidade. Este efeito é menos pronunciado em marcas de grande dimensão, que lançam gamas sustentáveis isoladas e, por isso, enfrentam maior ceticismo dos consumidores, por receio de práticas de greenwashing.

As grandes multinacionais do setor, como Unilever, Colgate-Palmolive ou Clorox, têm respondido a esta realidade com uma estratégia subtil. Ao invés de adaptarem diretamente as suas marcas históricas, optam por adquirir ou lançar marcas mais pequenas com identidade ecológica clara.
Na ausência de regulação, o estudo conclui que os incentivos económicos para as grandes marcas investirem seriamente em sustentabilidade são escassos. Apesar de alguma procura crescente, os consumidores continuam a preferir atributos convencionais. Por outro lado, as marcas pequenas beneficiam da diferenciação proporcionada pelas credenciais verdes, o que as torna mais competitivas num mercado saturado.
O quadro poderá alterar-se com a pressão legislativa. A União Europeia já obriga as empresas a comprovar cientificamente qualquer alegação ambiental nos rótulos, embora todos os efeitos ainda sejam em algumas situações dúbias e, noutros casos, há algum trabalho a fazer para entender todos os processos que contribuam para uma linha de sustentabilidade desde a cadeia de produção à comercialização. Outra modificação necessária passa pela forma como se sensibiliza o comportamento dos compradores, atendendo a que atualmente se mostra uma desconexão entre discurso e a ação.
Referência da notícia
Brecko, K., & Kim, Y. (2025). Sustainability and Strategic Differentiation: Rising Preferences and Divergent Brand Strategies in Unregulated Consumer Markets. Stanford Graduate School of Business, Working Paper No. 4257, 17 p. https://www.gsb.stanford.edu/faculty-research/working-papers/sustainability-strategic-differentiation-unregulated-consumer-goods