Lições de Pepe Mujica sobre as alterações climáticas: “A ciência avisou há muito, mas falhou a política”
O ex-presidente do Uruguai José “Pepe” Mujica tornou-se, ao longo dos últimos anos, numa das vozes mais coerentes e respeitadas da América Latina no que diz respeito à justiça social e ambiental. Saiba mais aqui!

Entre os seus vários discursos sobre as alterações climáticas, foi constante a crítica profunda à política internacional e ao modelo de desenvolvimento que, segundo ele, privilegia a acumulação em detrimento da vida.
Tentativa de mudar o panorama sobre a cultura dominante em matéria de sustentabilidade
Num vídeo enviado à Cimeira Climática das Juventudes Latino-americanas (RCOY), realizada em Cartago, na Costa Rica, Mujica deixou uma mensagem comovente e contundente. “Se continuarmos como estamos, caminhamos para um holocausto ecológico. Mas o problema ecológico tem uma base: o tipo de civilização predadora que desenvolvemos, onde os valores económicos estão acima de tudo”, afirmou.
Aos jovens presentes no encontro, que serviu como preparação para a COP27, Mujica apelou à reflexão sobre a cultura dominante.
A intervenção foi um dos momentos mais marcantes da cimeira e também da sua voz na proteção ambiental, onde também se ouviram vozes como a de Máximo Mazzocco, fundador da Eco House Global, que afirmou: “Se não estamos na mesa das decisões, somos parte do menu. Temos de ocupar o nosso lugar e recusar herdar decisões que outros tomaram por nós.” Mazzocco sublinhou ainda que a transição ecológica exige mudanças internas, emocionais e éticas, e a valorização da diversidade como património essencial da humanidade.
Durante o evento, nessa altura, jovens indígenas da Amazónia peruana também se fizeram ouvir, exigindo que o Estado garanta os seus direitos e respeite os territórios ancestrais. Apoiaram a proposta da COICA de proteger 80% da floresta amazónica até 2025, salientando a urgência de agir em consonância com os direitos humanos.
Durante a sua vida, Mujica deixou claro que distâncias, conhecimento e responsabilidade podem contribuir para a sustentabilidade e justiça ambiental
Noutras intervenções ao longo da sua vida, tal como no congresso Gure Lurra, realizado em Donostia, no País Basco, Mujica voltou a sublinhar a responsabilidade da humanidade perante a crise ecológica. “Não possuímos a Terra — é a Terra que nos possui. E se não corrigirmos o rumo, a natureza vai cobrar-nos um preço amargo.” Aos 87 anos, continuando a viver no campo e a trabalhar a terra, Mujica deixou claro que a distância entre o meio rural e as cidades precisa de ser encurtada, pois “sem camponeses nem pescadores não haverá comida”.

Com o seu estilo direto, o antigo presidente criticou ainda a incapacidade do capitalismo de se autorregular: “O capitalismo é formidável a multiplicar riqueza, mas não sabe parar. Por isso, são precisos governos que regulem.” Para Mujica, a mudança que o planeta exige não virá de soluções técnicas isoladas ou de discursos vazios, mas de uma transformação profunda da política, da economia e da cultura.
Com palavras simples, mas de enorme profundidade, Pepe Mujica legou à juventude uma responsabilidade e uma esperança: enfrentar a crise ecológica como uma causa de todos, com coragem, empatia e ação coletiva. A sua mensagem, carregada de realismo e humanidade, permanece como um guia moral para tempos incertos.