Um pequeno inseto australiano para travar a invasão das acácias no litoral
Cientistas portugueses estudam um inseto australiano capaz de controlar a praga das acácias no litoral, oferecendo uma solução natural para recuperar os ecossistemas dunares invadidos.

A invasão das dunas e zonas costeiras por Acacia longifolia, vulgarmente conhecida por acácia-de-espigas, é já um dos maiores desafios ecológicos no litoral português. Esta espécie exótica prolifera rapidamente, competindo com a vegetação nativa e modificando os ecossistemas dunares.
Agora, investigadores da Universidade de Coimbra (UC) e da Escola Superior Agrária de Coimbra (ESAC/IPC) descobriram que a introdução de um pequeno inseto australiano poderá constituir uma solução eficaz para conter esta praga.
A «invasão» das acácias
A acácia-de-espigas é originária do sudeste da Austrália e foi introduzida em Portugal sobretudo por via de arborização ou fixação de solos costeiros.Contudo, as suas características biológicas, rápido crescimento, abundante produção de sementes, adaptação ao ambiente costeiro fizeram dela uma espécie invasora de enorme sucesso.
No litoral português, especialmente na região Centro e Norte, as acácias proliferam nas dunas, empurrando a vegetação autóctone e alterando os habitats naturais.
Os problemas são vários: a formação de povoamentos densos de acácia limita a sobrevivência de espécies nativas, modifica o microclima e estrutura das dunas, e ainda contribui para a fixação de muito material vegetal morto que aumenta o risco de incêndio. Por isso, combater esta espécie tornou-se uma prioridade ambiental.
A solução biológica: vespa australiana
Para travar esta praga, os cientistas propõem agora a utilização do inseto Trichilogaster acaciaelongifoliae, uma vespa originária da Austrália que parasita especificamente a acácia-de-espigas. O mecanismo é simples, mas engenhoso: a fêmea da vespa deposita os ovos nas gemas florais da acácia.
Como consequência, a planta forma galerias (“galhas”) em vez de flores, impedindo a formação de vagens e sementes.
Com isto, o ciclo reprodutivo da acácia fica gravemente comprometido. Os investigadores observaram que, em áreas onde o agente já está instalado há nove anos, a produção de sementes praticamente desapareceu.
Os dados são impressionantes: o estudo revela que a introdução desta vespa pode reduzir até 98% a produção de sementes da acácia-de-espigas nas dunas portuguesas.
Porquê este método?
Optar pelo controlo biológico, em vez de apenas corte mecânico ou aplicação de herbicidas, apresenta várias vantagens:
- Menor impacto ambiental: evita o uso intensivo de químicos e perturbações acrescidas do solo.

- Sustentabilidade: uma vez instalado, o agente biológico pode continuar a atuar sem grandes intervenções.
- Focalizado: a vespa parece ter especificidade para a acácia-de-espigas, o que reduz o risco para outras espécies.
- Escalável: os resultados preliminares mostram que pode funcionar em grande escala, nas zonas costeiras.
Mas… quais os riscos e limitações?
Nenhuma estratégia é isenta de desafios. Alguns pontos a ter em conta:
- A vigilância continua é necessária para garantir que a vespa não se torne igualmente uma espécie invasora ou afete outras plantas indesejadamente.
- O controlo biológico raramente resolve tudo sozinho: os investigadores recomendam que a vespa seja usada em combinação com outras práticas, como o corte mecânico das acácias mais antigas, de modo a acelerar a regeneração da vegetação nativa.
- O sucesso em cada local pode depender de variáveis ambientais (solo, clima, exposição à costa) e da rapidez com que a vespa se estabelece.
- A implementação prática e em larga escala requer planeamento, acompanhamento e recursos, não basta “libertar o inseto e esperar”.
Impactos esperados
Se a estratégia for bem implementada, os benefícios poderão ser significativos:
- Redução da densidade de acácia nas dunas costeiras.
- Recuperação de habitats naturais dunares, permitindo a regeneração de espécies autóctones e a restauração da biodiversidade.

- Diminuição dos riscos associados à acumulação de biomassa das acácias, como o risco de incêndio ou do solo.
- Uma abordagem que pode servir de modelo para outros casos de espécies invasoras em Portugal e na Europa.
Claro que não é uma solução milagrosa e exige implementação cuidada e integrada, mas trata-se de um passo importante. Em última análise, a mensagem é clara: a luta contra espécies invasoras como a acácia-de-espigas passa por inovação, ciência e intervenção coordenada. Se o método der frutos, estaremos mais próximos de ver as dunas costeiras respirarem novamente, livres do domínio desta árvore invasora.