Os vermes da cera: a solução biodegradável para o plástico?

Uma recente descoberta da bióloga molecular, Federica Bertocchini, explica como é que o verme da cera mostra uma atitude extremamente ávida em relação à degradação do plástico em apenas 40 minutos.

larva da Galleria
As larvas Galleria mellonella lepidoptera transformam 50% do plástico que consomem em dióxido de carbono. Fonte: Público

A invenção do plástico durante a primeira metade do século XX, tornou-se numa conquista brilhante que mudou a sociedade nas décadas seguintes. Os plásticos entraram nas nossas vidas de tal forma que hoje, uma sociedade sem plásticos, seria simplesmente impensável.

Os resíduos plásticos podem permanecer no meio ambiente por décadas, espalhando-se pelo planeta e chegar aos cantos mais remotos de qualquer ambiente, seja água, terra ou ar.

Foi assim que a melhor característica deste material transformou um milagre do século XX (a invenção do plástico) numa das pragas do século XXI: a poluição, gerada pela disseminação omnipresente dos resíduos plásticos.

Um aspeto notável é que muitos dos aditivos presentes nos plásticos são tóxicos para os animais, incluindo humanos e esse pode ser, de facto, um dos aspetos mais perigosos da poluição plástica, a libertação lenta e prolongada de pequenos compostos tóxicos no meio ambiente.

A sua resistência deve-se à sua estrutura química particular, que é o resultado da síntese em laboratório. Os plásticos não existem na natureza, e isso pode explicar o porquê de não se degradarem num ambiente natural. Ou assim pensávamos, até agora.

A descoberta das larvas que quebram o plástico

A recente descoberta deu-se quando foi colocada uma lupa nalgumas larvas de insetos, capazes de quebrar as estruturas das poliolefinas mais resistentes, como polietileno (PE) e poliestireno (PS).

Especificamente, uma delas, a larva da Galleria mellonella lepidoptera, também chamada de verme da cera, mostrou uma atitude extremamente ávida em relação à degradação do plástico. A habilidade da lagarta foi descoberta no laboratório da cientista Federica Bertocchini, biotecnóloga do Centro de Investigações Biológicas Margarita Salas, em Madrid, resultado de uma dose saudável de interesse ambiental e preocupação plástica, juntamente com um pouco de serendipidade.

Tendo como hobby a apicultura, a cientista lida regularmente com colmeias e favos de mel. Os vermes da cera são considerados uma praga que infeta as colmeias, por isso, não é incomum encontrá-los dentro das colmeias. Numa ocasião, envolveu os germes num saco plástico comum e, em pouco tempo, encontrou o saco cheio de buracos. Seguiu-se assim uma análise laboratorial do plástico após o contacto com o invertebrado e a descoberta da sua capacidade de degradá-lo.

O efeito dos microrganismos sobre os plásticos têm sido normalmente associado à atividade metabólica desses microrganismos, tendo como resultado final a libertação de CO₂ no meio ambiente.

Larva
Micróbios no sistema digestivo dos animais ajudam a consumir o material. Fonte: Quo

Uma suposição generalizada no campo da biodegradação é que essas bactérias ou fungos utilizam o plástico como fonte de alimento, um cenário bastante incomum considerando o baixo valor nutricional deste polímero. De facto, dificilmente podemos dizer que há biodegradação de plásticos resistentes devido à atividade de bactérias ou fungos ambientais.

A degradação do plástico no meio ambiente decorre em grande parte de mecanismos abióticos, como a exposição à radiação UV ou ao calor.

A degradação microbiana observada até agora em condições experimentais é extremamente baixa, o que significa um tempo de incubação muito longo (meses) com muito pouca eficácia. Esta é uma das principais razões pelas quais ainda não existe uma ferramenta biotecnológica que nos permita acabar com o plástico.

A aposta nas larvas

Felizmente, a possibilidade de degradação por meios biológicos não se limita aos microrganismos. Diversas larvas de insetos foram encontradas, pertencentes à ordem Lepidoptera e Coleoptera, capazes de decompor polímeros plásticos resistentes. Este novo nicho começou há alguns anos, e os acólitos foram sendo adicionados mês após mês, tornando-o um campo cada vez mais amplo e de maior interesse.

O mais rápido entre os insetos capazes de degradar o plástico é a larva da Galleria mellonella lepidoptera, também chamada de lagarta. As suas larvas podem degradar o plástico dentro de 40 minutos após a exposição.

Estes invertebrados vivem e prosperam na colmeia, penetrando no favo de mel e deixando para trás um fio de filamento que produzem constantemente. Alimentam-se de tudo o que encontram naquele ambiente, como larvas de abelha, pólen ou cera.

Será a semelhança da cera com a estrutura química do plástico que torna estes vermes capazes de o quebrar? Ou é outro aspeto da sua natureza? A resposta ainda é desconhecida, assim como os mecanismos moleculares por trás desse forte efeito.

Em geral, os avanços tecnológicos podem, e esperamos que o façam, tirar-nos de um ciclo terrível e fornecer-nos a solução para o flagelo da poluição plástica que nos assola.