Bactéria descoberta no Oceanário de Lisboa é a mais recente esperança para salvar os corais

Investigadoras do Técnico estão entusiasmadas com a possibilidade de usar o novo microrganismo para colonizar os recifes ameaçados pelas alterações climáticas.

Oceanário de Lisboa
A nova bactéria recebeu o nome da capital portuguesa porque foi encontrada no Oceanário de Lisboa. Foto: Jorge Franganillo, CC-by-2.0., via Flickr.

O Oceanário de Lisboa, possui uma grande variedade de corais, pertencentes a diferentes ecossistemas marinhos - Atlântico, Índico, Pacífico e Antártico. Embora o seu número exato seja difícil de determinar, esta comunidade representa uma riquíssima coleção de todos os pontos do oceano.

Não é por acaso que são internacionalmente reconhecidos pela sua beleza e pelo seu excelente estado de saúde, promovendo serviços ecossistémicos essenciais para os mais de oito mil organismos marinhos que habitam os 30 aquários deste oceanário inaugurado em 1998 no Parque das Nações.

corais do Oceanário de Lisboa
A bactéria descoberta no Oceanário de Lisboa desempenha uma função essencial na alimentação e nas defesas dos corais contra os efeitos das alterações climáticas. Foto: nizz7, CC BY-NC-ND 2.0, via Flickr

Um ambiente controlado, protegido do aquecimento global, poderá explicar em parte por que estes corais estão tão bem conservados. Mas essa não é a única razão. Nem sequer será a principal.

Nas águas tranquilas do Oceanário de Lisboa, Daniela Silva, Matilde Marques e Joana Couceiro, alunas de mestrado e doutoramento do Instituto Superior Técnico descobriram a Endozoicomonas lisbonensis.

A bactéria, batizada com o nome da capital portuguesa, é responsável por manter saudável a comunidade de corais do oceanário.

As Endozoicomonas são simbiontes dos corais – os dois organismos interagem de forma mutuamente benéfica. Mas a E. lisbonensis, distingue-se sobretudo devido à capacidade de reduzir nitratos a nitritos.

E esse é um talento crucial para o ciclo do azoto, um dos mais importantes que assegura o equilíbrio do oceano e a saúde dos corais.

A descoberta e identificação desta nova bactéria pode por isso vir a representar um passo importante na conservação dos corais ameaçados em todos os oceanos.

Um impulso inesperado para a economia circular

Este organismo microscópico consegue ainda decompor os hidratos de carbono complexos comuns no ambiente, incluindo celulose, xilano e quitina.

O entusiamo que a E. lisbonensis desperta entre os especialistas está também relacionado com o seu potencial para impulsionar a bioeconomia circular.

Além dos benefícios que trazem para os corais, estas enzimas podem vir a ser muito úteis na reciclagem de resíduos da indústria do marisco.

Uma oportunidade para a proteção dos oceanos

A quitina é o principal nutriente da dieta dos corais e poderá ainda estar envolvida na defesa destas comunidades contra patógenos fúngicos.

Mosaico de imagens com peixes e corais
Endozoicomonas lisbonensis tem a capacidade de reduzir nitratos a nitritos, contribuindo ativamente para o ciclo do azoto, essencial à saúde dos oceanos e dos corais. Imagem: S K/Pixabay

A descoberta da E. lisbonensis no Oceanário de Lisboa pode, como tal, vir a representar uma oportunidade para proteger os oceanos, mas antes será preciso compreender em profundidade os mecanismos e os fatores evolutivos por detrás das suas interações.

Os desafios que se seguem após a descoberta

Muitas das hipóteses levantadas pelas investigadoras precisam ainda de ser testadas. Está-se diante de organismos minúsculos que facilmente passam desapercebidos, sendo também difíceis de manipular em laboratório.

A Endozoicomonas lisbonensis, na verdade, foi isolada em 2022, mas só agora, após uma sequenciação completa do seu genoma, foi possível confirmar que se trata de uma nova espécie.

Recriar as condições ideais para se desenvolverem sem constrangimentos é o grande desafio que a equipa do Técnico tem pela frente. O trabalho está a ser acompanhado de perto pelos investigadores Tina Keller-Costa e Rodrigo Costa, do Instituto de Bioengenharia e Biociências (iBB), pela Diretora de Biologia e Conservação, Núria Baylina, e também pela aquarista supervisora Elsa Santos, do Oceanário de Lisboa.

Parte da investigação foca-se em desenvolver novas formas de cultivar bactérias que até agora não conseguiam crescer em laboratório. Isto permitirá estudar o seu papel no ecossistema, explorar o seu potencial biotecnológico e, não menos importante, contribuir para a preservação da diversidade microbiana do planeta.

Um probiótico para regenerar os recifes ameaçados

Os corais estão entre os ecossistemas do planeta mais vulneráveis às alterações climáticas. Os recifes de corais são como cidades minúsculas para 25% da vida marinha, mas correm o risco de desaparecer num intervalo de 75 anos.

A bactéria recém-descoberta no oceanário promete contribuir para travar esta ameaça. A equipa de microbiologistas marinhos do Técnico está a investigar se é possível utilizar a E. lisbonensis como um probiótico para os corais.

Ameijôas e búzios na grelha (marisco)
Além dos efeitos probióticos para os corais, a bactéria também contribui para a reciclagem de resíduos marinhos, como o marisco, podendo impulsionar a bioeconomia circular. Foto: Quynh Ho/Pixabay

A lógica não é muito diferente das bactérias que também nós consumimos nos iogurtes e que melhoram o nosso sistema imunitário. O mesmo poderá acontecer com este microrganismo, que poderá colonizar os recifes de corais, ajudando-os a resistir ao aquecimento e acidificação das águas.

Referências da notícia

Daniela M. G. da Silva, Matilde Marques, Joana F. Couceiro, Elsa Santos, Núria Baylina, Rodrigo Costa1 & Tina Keller-Costa. Endozoicomonas lisbonensis sp. nov., a novel marine bacterium isolated from the soft coral Litophyton sp. at Oceanário de Lisboa in Portugal. International Journal of Systematic and Evolutionary Microbiology.

Investigadores do Técnico descobrem nova bactéria a habitar corais do Oceanário de Lisboa. Instituto Superior Técnico.