A crise silenciosa da imobilidade involuntária: por que o clima prende pessoas em zonas de risco

Populações "encurraladas": o desafio oculto da imobilidade involuntária ameaça a justiça climática global. Saiba mais aqui!

Em 2023, existiam cerca de 281 milhões de migrantes internacionais no mundo. Embora este número pareça enorme, representa apenas cerca de 3,6% da população global.

As alterações climáticas estão a remodelar a forma como as populações interagem com o ambiente, e embora o foco esteja frequentemente na migração, um problema mais insidioso é a imobilidade involuntária.

Este fenómeno descreve situações em que as pessoas desejam sair de áreas de risco climático elevado, mas são incapazes de o fazer devido a barreiras económicas, políticas ou sociais.

Na verdade, as alterações climáticas estão a aumentar tanto o número de pessoas forçadas a mover-se quanto o número de pessoas forçadas a permanecer.

O número de pessoas deslocadas à força (devido a conflitos, perseguição ou catástrofes) atingiu um recorde de 117 milhões no final de 2022.

Para as populações mais vulneráveis, a ausência de migração pode ser um reflexo de uma crescente fragilidade, e não de uma adaptação bem-sucedida.

As complexas dinâmicas de mobilidade

O resultado da mobilidade pode ser entendido através da estrutura aspirações-capacidades, onde aqueles que querem e podem mover-se experimentam a mobilidade voluntária, e aqueles que querem, mas não conseguem, ficam retidos na imobilidade involuntária.

Curiosamente, a investigação mostra que os grupos de rendimento médio são os mais propensos a migrar em resposta a riscos climáticos, pois têm recursos suficientes para se deslocarem, ao contrário dos mais pobres, que frequentemente não têm meios para suportar os custos de viagem ou encontrar alternativas de subsistência.

Por exemplo, pequenos agricultores no Nepal que dependem da migração para um amortecedor financeiro podem ver a sua capacidade de migrar comprometida quando as colheitas falham devido a impactos climáticos.

A nível internacional, os migrantes tendem a mover-se para locais com menor risco climático do que as suas áreas de origem.

A cultura Māori é uma das mais ricas e fascinantes do mundo. Eles são o povo indígena da Nova Zelândia, que eles chamam de Aotearoa ("A Terra da Longa Nuvem Branca").

As políticas fronteiriças mais restritivas podem encolher este fluxo de segurança, forçando as pessoas a permanecer em áreas mais expostas.

Drivers de imobilidade involuntária

O fenómeno da imobilidade resulta da interseção de múltiplos fatores:

  • Drivers económicos e físicos: os custos iniciais da migração são um obstáculo significativo. Além disso, a degradação dos recursos climáticos pode esgotar o capital necessário para a migração.
  • Barreiras físicas, como a infraestrutura rodoviária limitada ou danificada em estados insulares ou durante desastres, também dificultam ou impedem as evacuações.
  • Drivers políticos, legais e burocráticos: Restrições à mobilidade internacional e interna impõem a imobilidade a longo prazo. Exemplos incluem populações de estados insulares que carecem de mecanismos legais para sair face à subida do nível do mar e refugiados confinados a campos com pouca capacidade de migrar, como os Rohingya no Bangladesh, onde os assentamentos enfrentam altos níveis de exposição a inundações e deslizamentos de terra.
  • Os migrantes que ficam retidos em países de trânsito devido a restrições políticas também se tornam particularmente vulneráveis a riscos naturais.
  • Drivers sociais e culturais: O apego ao lugar, a perda de ligações comunitárias e de património cultural (como no caso dos marae Māori na Nova Zelândia) podem limitar a capacidade de migrar.
As pessoas migram por uma vasta gama de razões, que são geralmente agrupadas em fatores de pressão que as leva a sair, como guerra, pobreza e perseguição, e fatores de atração, o que as atrai para o novo destino, como melhores empregos, segurança e reunificação familiar.
  • As populações marginalizadas, como as pessoas sem abrigo, enfrentam barreiras sociais que restringem o seu acesso a refúgios e serviços durante ameaças naturais, o que pode duplicar a mortalidade relacionada com o calor até 2050 em contextos como Nova Iorque.

Implicações e respostas políticas

Em suma, para enfrentar a imobilidade involuntária, a política e o planeamento de desastres devem ser adaptados:

  • Centrar as aspirações: As políticas devem focar-se em reduzir as barreiras à migração para aqueles que desejam sair e em permitir meios de subsistência seguros in situ para aqueles que desejam permanecer.
  • Melhorar os dados: É crucial incluir sistematicamente os drivers de imobilidade nos processos de recolha de dados e realizar exercícios de mapeamento para identificar o tamanho e a localização destas populações vulneráveis.
  • A coprodução de conhecimento com comunidades locais e especialistas é fundamental para garantir que os dados reflitam as necessidades reais no terreno.
  • Cooperação internacional: Dada a projeção de que quase todos os campos de refugiados em todo o mundo enfrentarão um aumento de dias de calor perigoso até 2050, a cooperação internacional é essencial.

O artigo defende a criação de um mecanismo global de apoio à imobilidade involuntária com um mandato explícito, desbloqueando a ação climática direcionada e garantindo que os mais vulneráveis não sejam ignorados.

Referência da notícia:

Thalheimer, L., Cottier, F., Kruczkiewicz, A. et al. Prioritizing involuntary immobility in climate policy and disaster planning. Nat Commun 16, 2581 (2025). https://doi.org/10.1038/s41467-025-57679-9

Human behavior, Policy, Climate impacts - 4 key facts about climate change and human migration - https://sustainability.stanford.edu/news/4-key-facts-about-climate-change-and-human-migration