Investigadores europeus testam solução com ar quente para fornecer energia solar 24 horas por dia
ASTERIx-CAESar é o projeto, financiado pela UE, que poderá finalmente ultrapassar a incapacidade dos sistemas atuais em armazenar e fornecer energia totalmente descarbonizada nos períodos em que a procura é mais elevada.

A migração para a energia renovável está entre as principais estratégias para descarbonizar a economia e mitigar os efeitos do aquecimento global. Boa parte dos países do Mundo corre contra o tempo para conseguir atingir a neutralidade climática até 2050.
A energia solar desempenha um papel central nesta transição, mas os desafios são enormes. A raiz do problema, segundo os especialistas, é a incapacidade de os sistemas atuais assegurarem energia quando ela é mais necessária.
O abastecimento sustentável de energia durante a noite ainda é uma ambição longe do nosso alcance. As centrais solares fornecem eletricidade precisamente quando é menos necessária. A procura atinge o ponto mais baixo a meio do dia e alcança o pico quando anoitece.
Boa parte da luz solar convertida em energia renovável acaba desperdiçada porque não há suficiente capacidade de armazenamento. Este é o ponto em que estamos, mas tudo pode mudar se o projeto ASTERIx-CAESar, financiado pelo programa Horizonte, da União Europeia, for bem-sucedido.
Uma solução para os períodos em que Sol não brilha
Uma equipa internacional de especialistas em energias renováveis está a desenvolver um projeto-piloto na Plataforma Solar de Almería, um centro de investigação localizado no Sul de Espanha. O intuito é demonstrar a capacidade da energia solar térmica para fornecer uma alternativa de baixo custo ao armazenamento convencional assegurado por baterias.
A abordagem implica captar e armazenar o calor do sol (energia térmica), garantindo o acesso à energia solar mesmo durante os períodos em que o Sol não brilha.

O programa tem uma duração de quatro anos, prazo em que os investigadores esperam conseguir desenvolver uma central de energia solar térmica inovadora e de alta capacidade. O intuito do piloto é que a unidade industrial seja eficiente tanto na produção de energia solar concentrada, como no armazenamento de energia por ar comprimido.
Potencial e limitações das tecnologias de ar comprimido
Armazenar ar comprimido não é propriamente um conceito inédito. A sua viabilidade já foi demonstrada à escala comercial. Atualmente, existem três centrais a operar na Alemanha, nos Estados Unidos e na China.
O processo socorre-se da eletricidade excedente de baixo custo para comprimir o ar a uma pressão elevada, que é depois armazenado e utilizado para acionar as turbinas e gerar energia nos momentos de maior necessidade.
Ao contrário das baterias, estas tecnologias não dependem de matérias-primas críticas, como lítio, cobalto, cobre, grafite entre outros minérios usados nos veículos elétricos. Uma outra vantagem será a possibilidade de armazenar a energia em reservatórios instalados em antigas minas ou grutas, reduzindo ainda mais os custos de produção.
Uma outra alternativa, usada nas centrais fotovoltaicas convencionais, passa por recorrer à energia térmica para aquecer um líquido de sais fundidos, gerando vapor que aciona uma turbina e produz eletricidade. Mas todo esse processo é, segundo os especialistas, demasiado dispendioso para conseguir competir com outras fontes energéticas.
O calor solar substitui os combustíveis fósseis
Essas são as lacunas que o projeto ASTERIx-CAESar visa ultrapassar. Composta por especialistas de oito países da União Europeia, Suíça e Reino Unido, a equipa de engenheiros e académicos espera que o seu piloto consiga substituir o gás natural ou os vapores de sais fundidos por calor solar, tornando o armazenamento de energia por ar comprimido neutro em carbono.

A energia solar concentrada poderá ser, portanto, mais uma alternativa para as renováveis que os especialistas esperam desenvolver. Recorrendo a espelhos refletores, o processo concentra a luz solar num único ponto, que poderá ser no topo de uma torre, como acontece na Plataforma Solar de Almería, em Espanha.
No sistema que está a ser desenvolvido, a eletricidade renovável de baixo custo é usada para comprimir o ar armazenado durante o dia. Em simultâneo, a energia solar concentrada alimenta um depósito de energia térmica, libertada à medida que a procura aumenta. O ar comprimido é, de seguida, aquecido e as turbinas começam a funcionar.
Esta é a lógica por detrás deste modelo, mas o seu sucesso está ainda dependente da capacidade da tecnologia em converter a energia solar concentrada em energia térmica a cerca de 800ºC e conservá-la a estas altas temperaturas sem recorrer à queima de gás natural.
O modelo europeu testado no Sul de Espanha
São as temperaturas elevadas que permitem aumentar a potência de saída e assegurar a eficiência do processo. As soluções desenvolvidas no âmbito do piloto ASTERIx-CAESar estão a ser testadas na Plataforma Solar de Almería.
Tanques de armazenamento de alta pressão foram acrescentados à torre de energia solar concentrada com o objetivo de criar um sistema híbrido. Este passo será determinante para desenvolver um modelo em pequena escala.

Até setembro de 2027, a equipa europeia espera ter já uma central de energia solar térmica operacional capaz de disponibilizar energia renovável 24 horas por dia, sete dias por semana. Com o desafio do armazenamento finalmente ultrapassado, será possível oferecer estabilidade à rede e obter o dobro da eficiência, comparada com as atuais tecnologias.
Referências do artigo
ASTERIx-CAESar: Air-based Solar Thermal Electricity for Efficient Renewable Energy Integration & Compressed Air Energy Storage. ASTERIx-CAESar project
Michael Allen. From sunlight to stored power: how hot air could solve solar energy’s biggest challenge. Horizon Magazine.