Fundos deixam cair rótulos verdes para contornar regras anti-greenwashing da UE
Com novas regras da União Europeia contra o greenwashing, centenas de fundos retiraram termos como “sustentável” e “ESG” dos seus nomes. A alteração permite-lhes manter investimentos poluentes sem infringir as normas. Especialistas alertam para risco de perda de confiança dos investidores.

Perante o reforço das regras europeias contra o greenwashing, centenas de fundos de investimento estão a remover dos seus nomes termos como “sustentável”, “ambiental” ou “ESG”. A manobra visa evitar sanções e restrições impostas pelas novas orientações da União Europeia, permitindo que esses fundos continuem a investir em setores intensivos em carbono, como o petróleo, o gás e o carvão, sem entrarem em conflito com a regulamentação.
Fundos contornam novas exigências europeias ao abandonar rótulos sustentáveis
O chamado greenwashing – ou ecobranqueamento – designa práticas em que empresas ou produtos são apresentados como mais “verdes” ou sustentáveis do que realmente são, com o intuito de atrair consumidores e investidores sensíveis às causas ambientais. Para travar este fenómeno nos mercados financeiros, a Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA) publicou novas regras, em vigor desde o final de maio de 2025, que obrigam a maior rigor e coerência entre o nome do fundo e os ativos em que investe.
As novas regras estabelecem que qualquer fundo que utilize termos relacionados com sustentabilidade ou ambiente no seu nome — como “sustainable”, “green”, “ESG” ou “impact” — só poderá fazê-lo se, no mínimo, 80% dos seus investimentos estiverem alinhados com os objetivos sustentáveis referidos. Além disso, esses fundos ficam proibidos de investir em empresas cujo volume significativo de receitas derive de combustíveis fósseis ou de produção elétrica altamente poluente.
Perante este enquadramento mais exigente, muitas gestoras de ativos optaram por alterar a designação dos seus produtos para evitar terem de reestruturar os seus portfólios. Segundo uma análise do grupo alemão Finanzwende, 674 fundos europeus retiraram os rótulos verdes nos 12 meses que antecederam a entrada em vigor das novas normas.
Entre os grupos que mais recorreram a estas alterações estão State Street, UBS e Northern Trust. Nomes como “ESG”, “sustentável” ou “ambiental” deram lugar a termos como “seleção”, “comprometido”, “screened” ou “transição”, expressões que não estão reguladas pela ESMA e, por isso, não impõem os mesmos limites.
De acordo com Hortense Bioy, da Morningstar, esta tendência demonstra que os gestores ainda pretendem apresentar os seus fundos como “verdes”, mesmo que os critérios de investimento não sejam compatíveis com os padrões exigidos. “Alguns destes fundos tornaram-se praticamente fundos tradicionais, mas continuam a sinalizar compromisso com a sustentabilidade”, refere.
Mudança de nome evita restrições, mas não investimentos poluentes
A análise revela ainda que mais de metade dos fundos que retiraram rótulos ambientais continuam a investir em grandes empresas do setor fóssil, com um valor estimado de 14 mil milhões de euros em ações. Com a simples mudança de nome, conseguem evitar os critérios mais rigorosos sem perder exposição a ativos poluentes.
Por outro lado, algumas gestoras tomaram a via oposta: mantiveram os nomes “verdes” e ajustaram os seus portfólios. A BlackRock, maior gestora de ativos do mundo, comunicou aos clientes que retirou os termos sustentáveis de 56 fundos (avaliados em 45 mil milhões de euros), mas manteve os nomes ESG noutros 60 fundos (81 mil milhões de euros), reforçando os critérios de investimento sustentável. Também reviu as metodologias de 18 fundos (37 mil milhões de euros), alinhando-os com os conceitos de “transição”.
Segundo a ESMA, os fundos que mantêm termos como “ambiental”, “sustentável” ou “impacte” não podem investir em empresas com receitas acima de um certo limiar proveniente de combustíveis fósseis. Já os que utilizam palavras como “transição”, “evolução” ou “net-zero” não defrontam os mesmos limites.
As alterações nos nomes devem ser comunicadas aos investidores, geralmente através dos planos. No entanto, estas mudanças passam frequentemente despercebidas ao público geral. Bioy alerta que, apesar de não se poder falar tecnicamente em greenwashing no passado — por ausência de regras claras —, a nova regulamentação exige agora mais literacia financeira por parte dos investidores, que devem compreender as implicações legais dos termos utilizados.

As regras aplicam-se a fundos comercializados no espaço da UE, mas o impacte é global, já que grande parte dos produtos financeiros com alegações “verdes” são vendidos no mercado europeu.
No momento da publicação, a maioria das gestoras que mais recorreram à mudança de nomes, incluindo State Street, UBS, Northern Trust e Invesco, ainda não tinha respondido aos pedidos de comentário. A BlackRock sublinha que os objetivos de investimento dos seus fundos estão claramente divulgados e em conformidade com a legislação em vigor.