Inteligência artificial ajuda a prever sismos do supervulcão mais perigoso da Europa

A nova abordagem do Instituto Nacional de Geofísica e Vulcanologia, em Itália, conduziu a estimativas mais precisas dos riscos sísmico e vulcânico na caldeira dos Campos Flégreos, na região de Nápoles.

caldeira dos Campos Flégreos, Itália
Vista área da caldeira dos Campos Flégreos captada por drone. Foto: Alessandro Fedele, investigador do INGV

Considerada uma das caldeiras vulcânicas mais perigosas do mundo devido ao seu potencial de erupção, os Campos Flégreos, a 15 quilómetros a oeste do centro de Nápoles, em Itália, têm mobilizado a atenção de cientistas por todo o mundo.

Sendo o mais ameaçador da Europa, a atividade vulcânica é intensa, mas os especialistas estão também preocupados com aumento das suas emissões de dióxido de carbono (CO₂).

O supervulcão Campos Flégreos (ou Campi Flegrei) é uma caldeira vulcânica situada na região da Campânia com 40 vulcões individuais, distribuídos por 13 km. Esta vasta área abriga uma estrutura geológica complexa com 24 crateras, geiseres, fontes termais e edificações vulcânicas.

A crescente atividade ocorre principalmente na cratera Solfatara, hoje em estado de atividade fumarólica (emissões de gases quentes) e hidrotermal (poços de lama ferventes). Considerada um laboratório natural para o estudo da vulcanologia, a área deste conjunto geológico tem libertado, desde 2005, emissões diárias entre quatro mil e cinco mil toneladas de CO₂.

Uma erupção com impacto climático à escala planetária

Não é por acaso que os vulcanólogos chamam os Campos Flégreos de supervulcão. Este sistema vulcânico, extremamente poderoso, é capaz de produzir erupções milhares de vezes mais potentes do que os vulcões cónicos.

Uma única erupção dos Campos Flégreos poderia expelir mais de mil quilómetros cúbicos de material vulcânico (cinzas, gases, piroclastos, aerossóis e fragmentos maiores).

O bloqueio da luz solar por essas enormes nuvens vulcânicas poderia resultar num impacto climático à escala global, com uma queda drástica das temperaturas do planeta, destruição maciça da vegetação, contaminação dos solos e água, e interrupção de ciclos ecológicos.

mapa sísmico da região de Nápoles
Os vários tons de vermelho no mapa indicam diferentes profundidades de sismos. Imagem: Instituto Nacional de Geofísica e Vulcanologia (INGV)

A sua vigilância é por isso uma prioridade para os especialistas, envolvendo diferente técnicas, como monitorização de terremotos, medições da deformação do solo e análises dos gases emitidos pelas fumarolas.

IA traz maior rigor na previsão sísmica

Com o advento da inteligência artificial (IA), há uma nova esperança, entre os investigadores, que conseguiram agora prever com maior rigor os riscos sísmicos e vulcânicos da caldeira dos Campos Flégreos.

Segundo o estudo coordenado pelo Instituto Nacional de Geofísica e Vulcanologia (INGV), de Itália, os dados obtidos através da IA permitiram detalhar com alta precisão um sistema de falhas ativo, fornecendo informações valiosas sobre o fenómeno bradissismo, que deforma a crosta da Terra provocando sismos na caldeira dos Campos Flégreos.

O que é o fenómeno bradissismo? É o movimento lento de subida ou descida da crosta terrestre causado por ação vulcânica, resultando na elevação ou rebaixamento do solo numa área.

O trabalho conduziu à identificação de mais de 50 mil sismos entre 2022 e meados de 2025, mostrando que quase todos os eventos sísmicos têm origem tectónica, com profundidades inferiores a quatro quilómetros.

A investigação, publicada na revista Science, foi realizada por uma equipa internacional de cientistas do Departamento de Geofísica da Escola de Sustentabilidade Doerr de Stanford, nos Estados Unidos, do Observatório do Vesúvio do INGV e da Universidade de Nápoles Federico II.

O estudo permitiu identificar um sistema de falhas em anel, uma região de intensa atividade sísmica e vulcânica.

Essas fraturas detetadas ao redor da caldeira estão bem definidas, estendendo-se tanto em terra como no Golfo de Nápoles, podendo levar, de acordo com os autores do estudo, a estimativas mais precisas do perigo e risco sísmico na região.

cratera Solfatara, na cidade de Pozzuoli, em Itália
A crescente atividade sísmica dos Campos Flégreos ocorre principalmente na cratera Solfatara, na cidade de Pozzuoli. Foto: Graeme Churchard, C BY 2.0, via Flickr

O novo sistema de análise de sinais sísmicos baseado na inteligência artificial, implementado durante a investigação, já está operacional, podendo a partir de agora reforçar a vigilância da atividade vulcânica e sísmica dos Campos Flégreos.

Atividade sísmica bate recorde em 2024

A população da região de Nápoles habituou-se aos sismos e tremores de terra frequentes como o registado em março deste ano, quando a cidade foi atingida por um sismo de magnitude de 4,4 na escala de Richter.

A atividade sísmica nos Campos Flégreos tem crescido nos últimos anos, com um aumento na frequência e intensidade dos tremores. Segundo o INGV, só no ano de 2023 foram contabilizados mais de 2800 tremores, com a área de Pozzuoli particularmente afetada. O recorde, todavia, foi registado no ano passado, com 6740 sismos, tendo o enxame sísmico (série de tremores na mesma região), continuado em 2025.

A caldeira dos Campos Flégreos formou-se há 40 mil anos após uma erupção vulcânica catastrófica. O fenómeno resultou no colapso de uma grande área da crosta terrestre, criando uma caldeira vulcânica e não um vulcão tradicional em forma de cone.

A população da região teme que o supervulcão possa entrar em erupção a qualquer momento. A última vez que tal aconteceu foi em 1538. Desde então, não houve outro incidente, mas a formação está instável há mais de 70 anos. Durante este período, a cidade costeira de Pozzuoli foi levantada em quase quatro metros.

Referências da notícia

CAMPI FLEGREI | Artificial Intelligence applied to develop a high-definition seismic catalog. Instituto Nazionale de Geofisica e Vulcanologia.

Xing Tan, Anna Tramelli, Sergio Gammaldi, Gregory C. Beroza, William L. Ellsworth & Warner Marzocchi. A clearer view of the current phase of unrest at Campi Flegrei caldera. Science