Conheça os locais do globo onde o calor mais está a aumentar

À medida que o atual período de desregulação climática continua a cozinhar lentamente o planeta, precisamos de saber quando e onde irão ocorrer episódios de calor extremo. Contamos-lhe os detalhes aqui!

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A exposição ao calor representa hoje uma grande ameaça para populações de alto risco, contribuindo substancialmente para o aumento da morbilidade e mortalidade.

O mundo está a viver um aumento dos dias de calor extremo e que colocam a saúde humana em risco, com a ameaça concentrada em alguns dos locais do planeta menos preparados para lidar com a situação. A verdade é que o risco de ocorrência de episódios extremos de calor, potencialmente mortíferos para a população, aumentou substancialmente nos últimos 20 anos.

À medida que estes se tornam mais comuns, as pessoas precisam de saber quando e onde irão ocorrer. Mas modelar e prever o calor é complicado. Um estudo conjunto realizado pelo The Washington Post (TWP) e pela CarbonPlan, uma organização sem fins lucrativos, vem, enfim, trazer uma nova luz sobre este tema.

Exposição ao calor extremo

A exposição ao calor representa hoje uma grande ameaça para populações de alto risco, contribuindo substancialmente para o aumento da morbilidade e mortalidade. A mortalidade relacionada ao calor tem sido, aliás, uma grande preocupação nas últimas duas décadas na Europa, especialmente após o excesso de 71.449 mortes registadas durante os meses de junho, julho, agosto e setembro de 2003. Só no ano passado, estima-se que tenham tenham existido 61.672 mortes atribuíveis ao calor.

Ora, o mês de agosto que ainda agora terminou vem confirmar uma tendência de persistência das condições recorde. Estima-se que tenha sido cerca de 1,5 ºC mais quente do que a média pré-industrial, tendo sido registada a temperatura média mensal global mais alta da superfície do mar alguma vez medida, quase 21 °C.

De acordo com o sistema Copernicus, o Programa de Observação da Terra da União Europeia, até agora, 2023 é o segundo ano mais quente já registado, atrás apenas de 2016.

O colapso climático começou”, alertou António Guterres quando a Organização Meteorológica Mundial (OMM) informou que o mundo passou pelo verão mais quente já registado no Hemisfério Norte.

O calor extremo é um perigo para todos os segmentos da sociedade, mas aqueles que vivem em ambientes urbanos ou em condições mais vulneráveis são os que mais sofrem. A ligação entre a urbanização, vulnerabilidade (seja ela económica ou física, por exemplo) e os riscos térmicos tornar-se-á mais urgente à medida que mais pessoas, um pouco por todo o mundo, se deslocarem para áreas urbanas.

De acordo com o Relatório Mundial das Cidades 2022, publicado pelo ONU-Habitat, 68% da população do planeta viverá em áreas urbanas até 2050, acima dos cerca de 56% em 2021.

Também até 2050, mais de 5 mil milhões de pessoas estarão expostas a, pelo menos, um mês de calor extremo, mostra a análise conjunta do TWP e da CarbonPlan.

O estudo define como 32 ºC o limiar a partir do qual se considera um calor extremamente arriscado para a saúde, partindo de um exercício métrico que tem por base a "temperatura de bolbo húmido". Ao contrário de outras medidas mais conhecidas, como o índice de calor, a "temperatura do bolbo húmido" ilustra como o sol e o vento também afetam a capacidade das pessoas se manterem frescas.

A partir deste método concluiu-se que até 2050, 1.3 mil milhões pessoas estarão expostas a temperaturas consideras perigosas, contra 500 milhões em 2030 e os 100 milhões registados no início do século.

Os lugares do globo mais afetados

A maior parte da população afetada (80%) por dias extremamente quentes viverá em países pobres, cujo produto interno bruto (PIB) per capita estimado em 2030 seja inferior a 25 000 dólares, especialmente em regiões já quentes, como o sul da Ásia e a África Subsariana, que carecem, por exemplo, de sistemas de refrigeração e de sistemas avançados de cuidados de saúde. Por outro lado, 2% viverão em países com um PIB per capita igual ou superior a 100 000 dólares.

A análise mostra também quais locais do planeta azul enfrentarão aumentos repentinos de temperaturas escaldantes que ameaçam a capacidade das pessoas em lidar com a situação, e quantos dias se esperam ser altamente perigosos para o ser humano, mesmo em locais que há muito são tórridos.

Pekanbaru, na Indonésia terá, em 2050, 344 dias de calor muito perigoso a cada ano, o maior número de qualquer grande cidade. Belém, no Brasil terá mais de seis meses de calor extremo até 2050, o aumento mais acentuado de qualquer grande cidade. Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, 189 dias. Freetown, na Serra Leoa, 92 dias. Madrid, na vizinha Espanha, enfrentará 9 dias de calor abrasador.

Na Índia, por exemplo, 270 milhões de pessoas enfrentarão calor extremo, mesmo em ambientes fechados, até 2030. Mas, em 2018, apenas cerca de 5% das habitações do país tinham ar condicionado, segundo a Agência Internacional de Energia. Na Serra Leoa, onde o calor sufocante será regra, espera-se que apenas 2% dos agregados familiares do país tenham ar condicionado até 2030.

Quem trabalha ao ar livre está naturalmente mais exposto a este perigo, e também esta realidade se sucede nos países mais quentes e de maior risco. Na Índia e no Paquistão, os trabalhadores ao ar livre representam 56% e 47% da força de trabalho, respetivamente.

Nem sempre estes trabalhadores estão legalmente protegidos. Apenas alguns países, como Chipre, Emirados Árabes Unidos e Qatar, possuem legislação que proíbe o trabalho ao ar livre em condições demasiado quentes. Na China, uma lei exige que os empregadores paguem mais quando as temperaturas sobem acima dos 35 ºC.

Este estudo mostra, mais uma vez, uma dura realidade: os impactes serão sentidos nos países desenvolvidos, mas serão os de baixos rendimentos aqueles que mais sofrerão. As condições de vulnerabilidade de cada um deles e dos seus povos ditarão os seus rumos.