Como a concentração de PM2,5 influencia as mortes por calor? Finalmente uma resposta

Recente estudo publicado na revista Nature aporta novas e importantes informações sobre a relação entre os extremos climáticos e a poluição do ar por partículas finas em suspensão na mortalidade. Veja os resultados aqui!

mortes por calor
Um novo estudo mostra que os efeitos agudos detetados foram mais fortes e robustos nas estações quentes.

As temperaturas extremas representam um dos desafios ambientais mais severos. Com o processo de mudança climática global, os extremos climáticos tornaram-se mais frequentes e intensos um pouco por todo o mundo.

Também a poluição do ar é um problema ambiental sério de grande risco para a saúde pública. A exposição a curto e longo prazo a poluentes atmosféricos tem sido associada a impactos vários na saúde.

Existe uma consistência considerável entre vários estudos de que a exposição de curto/longo prazo ao PM2,5 está relacionada a um aumento de doenças cardiovasculares e respiratórias agudas e a mortalidade prematura excessiva.

Porém, apesar da exposição a temperaturas extremas ou partículas finas estar associada a resultados adversos à saúde, os seus efeitos interativos permanecem ainda obscuros.

Importa assim perceber quais os efeitos interativos de temperaturas extremas e da poluição por PM 2,5 (partículas finais em suspensão) sobre a mortalidade.

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As estimativas mais recentes da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que mais de 7 milhões de pessoas morrem prematuramente todos os anos devido à exposição prolongada à poluição do ar exterior. A situação agrava-se particularmente na China, onde o número de mortes relacionadas ao PM2,5 chegou às 850 mil pessoas em 2017.

Efeitos interativos de temperaturas extremas e de poluição por PM2,5

Diversos estudos outrora realizados, que examinaram os impactos dos poluentes atmosféricos em diferentes intervalos de temperatura, demonstraram uma sobrecarga de saúde significativamente maior em temperaturas extremas do que em temperaturas moderadas.

Vários trabalhos realizados na China e nos Estados Unidos da América exploraram o efeito interativo entre temperaturas extremas e os principais poluentes atmosféricos (como PM2,5 , PM10 , SO2 e NO2) sobre o nascimento prematuro, a mortalidade precoce e por causa específica, e detetaram interações positivas entre períodos de frio e ondas de calor com poluentes do ar, na mortalidade por doenças respiratórias e circulatórias.

Recentemente, um estudo realizado por um conjunto de investigadores chineses, publicado na revista Nature, pretendeu explorar as interações de temperaturas extremas e poluição por PM2,5 na mortalidade, com base nos dados diários de mortalidade recolhidos durante 2015 e 2019 na província de Jiangsu, na China.

Poluição do ar em Shangai, China.

Este é o primeiro estudo a fornecer avaliações quantitativas e informações importantes sobre as interações entre os extremos quentes e frios e a poluição do ar e os efeitos na saúde pública. O estudo fornece evidências dos efeitos interativos de temperaturas extremas e poluição PM2,5 na mortalidade total e por causas específicas.

O trabalho mostra que a exposição à poluição por PM 2,5 e a temperaturas extremas foram associadas ao risco excessivo de mortalidade total e por causas específicas, devido à sua interação. As interações entre poluição por PM2.5 e extremos frios foram principalmente positivas, mas menos significativas. No entanto, os efeitos sinérgicos mais significativos foram detetados entre o PM2,5 e extremos quentes. As interações foram mais robustas nas mortalidades respiratórias do que cardiovasculares.

A associação entre mortalidade por causas específicas e altas temperaturas foi mais profunda nos menos escolarizados. O risco de mortalidade respiratória relacionada a poluentes atmosféricos também foi maior em mulheres do que em homens, sob extremos de calor e frio.

Níveis de escolaridade mais baixos estão associados a níveis socioeconómicos mais baixos, o que pode levar a ambientes habitacionais precários, pouco conhecimento preventivo e acesso limitado a cuidados de saúde.

Diferentes respostas fisiológicas às temperaturas ambientes e aos poluentes atmosféricos por género, podem ser uma das razões para as disparidades entre mulheres e homens. Em comparação com os homens, as mulheres têm uma reatividade das vias aéreas ligeiramente maior, vias aéreas menores que os homens e deposição diferente de partículas.

Em suma, o estudo mostra que os efeitos agudos detetados foram mais fortes e robustos nas estações quentes, mesmo apesar a concentração de PM2.5 ser maior em períodos mais frios. Esta relação é explicada, por um lado, pela menor exposição à poluição em períodos mais frios, por exemplo, pela menor propensão a realizar atividades físicas ao ar livre, e por outro, pelo aumento do fluxo sanguíneo cutâneo, da ventilação minuciosa e da sudorese nas estações quentes.

A rápida urbanização, as grandes concentrações populacionais e as mudanças drásticas no meio ambiente tornaram a China numa das regiões mais vulneráveis que experimentam ondas de calor frequentes. Em 2022, mais de metade da China continental enfrentou um evento de calor extremo que durou mais de 30 dias, com a temperatura mais alta a atingir mais de 44ºC.

Com a co-ocorrência mais frequente de temperaturas extremas e poluição por PM2,5 , as descobertas do estudo fornecem mais um argumento a favor de iniciativas que tratem da qualidade do ar como prioridade para a saúde pública, bem como da adoção de medidas específicas para os públicos mais vulneráveis identificados - mulheres e população menos instruída.