Cientistas de Cambridge criam bactérias a partir do zero e quebram os limites do código genético natural

Os investigadores de Cambridge criaram uma nova forma de vida, que é mais eficiente do que a criada pela natureza. Segundo eles, esta descoberta permitir-lhes-á explorar o “que a vida tolera”, isto é, os limites da biologia.

De maneira simplificada, um codão é uma sequência de três letras que se encontra no ADN e no ARN e que fornece instruções para os aminoácidos, um bloco de construção fundamental da vida.

"O código genético quase universal utiliza 64 codões para codificar 20 aminoácidos e a síntese de proteínas. Neste estudo, concebemos e gerámos Escherichia coli com um genoma sintético, no qual substituímos sete codões. O organismo resultante, Syn57, usa 55 codões para codificar os 20 aminoácidos canónicos", começa um estudo publicado na Science que descreve uma nova forma de vida artificial que seria mais eficiente do que a criada pela evolução.

O que significa isto?

Ao longo dos últimos milhares de milhões de anos, toda a vida conhecida na Terra utilizou 64 codões. Um codão, em termos simples, é uma sequência de três letras que se encontra no ADN e no ARN e que fornece instruções para os aminoácidos, um bloco de construção fundamental da vida. Em 1966, os cientistas decifraram o código que detalhava quais os codões que correspondem a quais aminoácidos, revelando apenas 20 aminoácidos no total.

Curiosamente, aperceberam-se de que a evolução não tinha resultado numa eficiência perfeita, uma vez que alguns codões eram claramente redundantes. Isto levantou uma possibilidade tentadora: seria possível eliminar alguma da redundância, concebendo um organismo mais eficiente a partir do zero?

Os avanços científicos rumo a um organismo mais eficiente a partir do zero

Da possibilidade tentadora em teoria, à conceção de um organismo mais eficiente a partir do zero na prática, passaram-se várias décadas.

  • Em 2010 uma equipa de 24 cientistas criou a primeira célula bacteriana sintética do mundo.
  • Em 2019, especialistas em genética conseguiram remover essa redundância natural e retrabalhar uma cadeia de E. coli até 61 codões, provando que a vida poderia realmente funcionar com menos do que os 64 codões comprovados. Este feito foi considerado pela Ciência como a “tentativa mais ambiciosa de uma forma de vida totalmente sintética” até à data.

Apesar de ser um avanço que demorou décadas a concretizar, a célula artificial é ainda apenas uma recriação fiel da antiga versão de 64 codões.

Escherichia coli
Bactéria E. coli, a base da nova forma de vida.

Foi assim que se chegou à equipa liderada por Wesley E. Robertson, do Laboratório de Biologia Molecular da Universidade de Cambridge, que afirma ter concebido uma bactéria cujo código genético é mais eficiente do que o de qualquer outra forma de vida na Terra.

E agora foram ainda mais longe. Para criar a Syn57, a equipa de Robertson embarcou no meticuloso processo de alteração de mais de 101.000 linhas de código genético, primeiro em teoria e depois na prática.

Ao contrário das bactérias sintéticas de 2010, os avanços na síntese de ADN permitem aos investigadores genéticos construir genomas a partir do zero, evitando alguns codões redundantes desde o início.

“Podemos começar a explorar o que a vida tolera, podemos finalmente testar estes códigos genéticos alternativos. Passámos certamente por momentos em que nos perguntámos: “Será que vai ser um beco sem saída ou podemos ir até ao fim?”, afirma em entrevista o biólogo sintético de Harvard - Akos Nyerges - que não participou no estudo, mas fez parte das equipas de 2010.

E qual foi o resultado desta árdua experiência? “A vida continua a funcionar”, conclui o estudo.

Referências da notícia

Wesley E. Robertson et al., Escherichia coli with a 57-codon genetic code. Science 0, eady4368 DOI: 10.1126/science.ady4368

Científicos de Cambridge crean una nueva forma de vida. Y es más eficiente que la creada por la naturaleza. Juan Scaliter. La Razón. 26 agosto 2025.