Biotecnologia portuguesa quer cultivar o polvo em laboratório e salvar a espécie da extinção

Nos laboratórios de Castelo Branco está em curso uma investigação pioneira para proteger o animal da pesca predatória e das alterações climáticas.

Polvo a ser confecionado na cozinha
Os portugueses são os maiores consumidores de polvo da Europa. Foto: StockSnap via Pixabay

O polvo está seriamente ameaçado. Não é somente a pesca predatória que acelera o seu declínio. É também a mineração, a poluição e as alterações do clima que estão a destruir o seu habitat e locais de reprodução.

Os cativeiros não são uma solução para esta espécie, que necessita de ser alimentado com grandes quantidades de peixe, tornando a aquicultura numa prática insustentável.

Esta criatura marinha, nas águas portuguesas, corre grande perigo. Os portugueses gostam mesmo muito de polvo, seja à lagareiro, no arroz, em filetes ou numa simples salada. Contas feitas, são mais de 15 mil toneladas da espécie apanhadas por ano, o maior consumo entre os europeus.

Barco de pesca
A pesca e as alterações climáticas estão a acelerar o declínio do polvo. Foto: Thomas G. via Pixabay

O futuro do polvo está, portanto, dependente da nossa capacidade de proteger os seus habitats, garantir a sustentabilidade da pesca e resolver as questões éticas e ambientais relacionadas com a criação em cativeiro.

Alternativa sustentável

Será que teremos de abdicar desta espécie em nome de uma causa maior? Refrear o apetite tem de fazer parte da solução, mas o Centro de Apoio Tecnológico Agroalimentar (CATAA) de Castelo Branco quer oferecer-nos uma alternativa.

Nos seus laboratórios estão a cultivar células de polvo para virem a substituir o animal no nosso prato.

Estará, provavelmente, a pensar que não é o mesmo, mas é preciso superar essa resistência inicial. A estratégia dos investigadores está essencialmente focada na aplicação da biotecnologia azul celular para obter novos alimentos sustentáveis, sem alterar o sabor, a cor e a textura originais.

O CELLBLUE é um projeto português ambicioso com o intuito de vir a oferecer uma escolha rentável à indústria alimentar. Financiado pela União Europeia, o piloto do Centro de Apoio Tecnológico Agroalimentar de Castelo Branco visa encontrar uma resposta à pressão que a produção de alimentos exerce sobre os recursos naturais.

Vantagens da agricultura celular

Os alimentos celulares são produzidos a partir do cultivo de células em ambiente controlado. A grande vantagem é, principalmente, a possibilidade de eliminar a necessidade de grandes áreas de cultivo e reduzir o consumo de recursos como água e solo.

Os alimentos celulares podem ser projetados com perfis nutricionais específicos, oferecendo opções mais saudáveis para os consumidores sem gerar resíduos ou poluentes.

O método começa agora a ser encarado como uma forma de minimizar os impactos sobre os ecossistemas naturais, sem comprometer uma produção eficiente e sustentável.

As semelhanças com cerveja e iogurtes

Mas como é que o CATAA irá ajudar a proteger o polvo? Desde logo, em vez de recorrer a animais de criação, cultiva a carne em laboratório a partir de uma amostra espécie.

A investigação está em curso e nem sequer será preciso sacrificar o polvo. As suas células podem ser retiradas, continuando a crescer no laboratório.

A Cell4Food, start-up açoriana, está entre as parceiras do projeto, que, nas suas instalações de Braga, usar uma tecnologia muito semelhante com a produção de iogurtes ou cerveja.

Laboratório
O cultivo de células em laboratório para a produção de alimentos é encarado como uma estratégia promissora para proteger os recursos naturais. Foto: Darko Stojanovic via Pixabay

O cultivo de células de polvo, no fundo, é um processo idêntico a grandes incubadoras que promovem a fermentação. Da mesma maneira que se produz milhões de litros de cerveja ou de embalagens de iogurte, poder-se-á, em teoria, produzir também milhões de quilos de polvo.

À medida que o método e os resultados forem evoluindo, o sabor, a cor e a textura vão ser cada vez mais fiéis às características reconhecidas na carne do polvo.

Polvo no fundo do mar
O polvo tem inteligência excecional, sendo capaz de recorrer à sua memória para superar problemas, escapar de labirintos ou fugir de predadores. Foto: Sandrine Rongère via Pixabay

Usando técnicas laboratoriais será possível desenvolver um método alternativo à pesca convencional. Espera-se que, no final desta caminhada, se possa obter vários produtos alimentares típicos da gastronomia portuguesa.

Mas a estratégia vai além-fronteiras, pretendendo posicionar-se como uma opção para grandes mercados internacionais, como é o caso do asiático.

Referência da notícia

CELLBLUE: Alimentos do Futuro através da Biotecnologia Azul Celular - Centro de Apoio Tecnológico Agroalimentar (CATAA).