Geólogos confirmam que o Estreito de Gibraltar vai desaparecer em breve: “A Europa e a África vão unir-se”
Um novo estudo sugere que a ligação entre a Europa e África poderá ser restabelecida, transformando o mapa global dos oceanos. Eis as razões e os prazos apresentados pelos cientistas para que o Mediterrâneo se torne definitivamente um mar fechado.

Um estudo recente, publicado na revista Geology, causou uma grande agitação entre geólogos e investigadores: segundo os seus modelos, a zona de subducção sob o estreito de Gibraltar não está “morta”, como muitos pensavam, mas vai estender-se em direção ao Atlântico, o que poderá fazer desaparecer a passagem entre a Europa e a África.
Um oceano que não durará para sempre tal como o conhecemos
Embora os oceanos pareçam ser permanentes, a tectónica de placas continua o seu curso. Assim, estas grandes massas de água nascem, expandem-se e acabam por se fechar - como aconteceu no passado com o Tétis - através do chamado ciclo de Wilson, que acabará por afetar também o Atlântico.
Este novo estudo, liderado por geólogos das Universidades de Lisboa (Portugal) e Johannes Gutenberg em Mainz (Alemanha), sugere que a subducção - o afundamento de uma placa tectónica sob outra - que ocorre atualmente no Mediterrâneo ocidental, sob o Estreito de Gibraltar, irá migrar para o Atlântico.

Consequentemente, esta “invasão de subducção” daria lugar a um sistema de subducção atlântico, semelhante à zona de subducção mais ativa do Pacífico, conhecida como “anel de fogo”.
O que é que significa o “desaparecimento” de Gibraltar?
Como é que isso aconteceria? As placas tectónicas - a placa africana e a placa euro-asiática - continuariam a convergir até que a litosfera oceânica atlântica submergisse sob a placa adjacente, provocando a elevação da terra e o encerramento efetivo da passagem marítima.

E isso significará que a Europa e a África voltarão a estar ligadas por terra, algo que já aconteceu com a crise messiniana, há cerca de 5,9 milhões de anos.
Nessa altura, o Mediterrâneo secou completamente devido ao encerramento do Estreito de Gibraltar, criando uma ponte terrestre entre a África e a Europa que durou cerca de 600 000 anos e permitiu que a fauna africana se deslocasse para a Europa.
Mas, segundo os investigadores, esta mudança não será imediata: estimam que a fase inicial da migração terá início dentro de cerca de 20 milhões de anos, o que em termos geológicos é considerado “precoce”. Após este período relativamente lento, o avanço da subducção no Atlântico poderá acelerar.
Da calma à tempestade tectónica
Para muitos especialistas, a zona de Gibraltar era considerada dormente ou praticamente inativa, porque o seu avanço tectónico tinha abrandado significativamente nos últimos milhões de anos.
Mas o novo modelo 3D criado para este estudo, apoiado por um poder computacional moderno e por dados geodinâmicos recentes, sugere que este abrandamento é apenas uma fase de “dormência” antes do seu recomeço.

Além disso, alertam, a continuação da subducção poderá ter consequências profundas: a formação de um “anel de fogo” atlântico, com um aumento da atividade sísmica e vulcânica em zonas atualmente calmas.
Em todo o caso, é de notar que esta previsão se baseia em modelos computacionais que, embora sofisticados e apoiados por décadas de dados, ainda apresentam incertezas. Afinal de contas, a dinâmica da Terra é complexa e há muitos fatores que podem alterar a velocidade ou a forma da subducção.
Porque é que é importante se isso vai acontecer daqui a milhões de anos?
Embora falar do “desaparecimento” do Estreito de Gibraltar e de uma união entre a Europa e a África possa parecer chocante, é importante lembrar que estas mudanças ocorrem em escalas de tempo tão longas que nenhuma civilização conhecida alguma vez as testemunhará. Em contrapartida, o processo de que aqui estamos a falar é de curta duração à escala geológica.
¿Sabías que el Mediterráneo se secó casi completamente hace entre 5,96 y 5,33 millones de años? Este evento se conoce como la crisis del Messiniense.
— IGEO (CSIC-UCM) (@IGeociencias) September 9, 2024
Hoy en el #IGEOquiz vamos a descubrir cómo se llegó a esta situación, comenzamos pic.twitter.com/mT7cSflB2t
No entanto, a compreensão destes processos ajuda-nos a perceber que a Terra é um planeta vivo, em constante transformação.
Os mapas que hoje consideramos imutáveis são apenas fotografias de um instante na imensa história geológica. As montanhas, os continentes, os oceanos e até a forma dos mares mudaram vezes sem conta.
É por isso que esta investigação não tem por objetivo alarmar, mas sim alargar a nossa perspetiva: vivemos num planeta em movimento, onde o tempo geológico marca o ritmo das transformações que moldam continentes inteiros. Compreender isto liga-nos à longa história da Terra e ao nosso papel de observadores de um mundo que não pára de mudar.
Referência da notícia
Gibraltar subduction zone is invading the Atlantic. João C. Duarte, Nicolás Riel, Filipe M. Rosas, Antón Popov, Christian Schuler y Boris JP Kaus. Geología (2024) 52 (5): 331–335. https://doi.org/10.1130/G51654.1