Batalha de Aljubarrota foi há 640 anos: como o poderoso exército de Castela foi dizimado pelos portugueses
A 14 de agosto de 1385, seis mil homens, sob o comando de Nuno Álvares Pereira, derrotaram 30 mil soldados castelhanos. Leia aqui o relato de uma vitória decisiva para a independência de Portugal.

À cabeceira da mesa do conselho militar, Dom João I ouve as mais altas figuras do exército português. A reunião em Abrantes é da máxima importância. O reino está prestes a entrar em guerra.
O monarca castelhano está convencido de que conquistou o direito à coroa pelo casamento com Dona Beatriz, a filha de Dom Fernando I de Portugal, que morreu em 1383 sem deixar um sucessor. Meses antes, deste lado da fronteira, o povo aclama Dom João, mestre da Ordem de Avis, rei de Portugal, numa tentativa desesperada de não cair nas mãos dos espanhóis.
O conselho de guerra em Abrantes
Convocadas agora as forças militares de todas as zonas do país, Dom João I de Portugal procura ouvir as melhores estratégias dos seus aliados para travar o rei de Castela. Estão todos em sobressalto. Gritam e esbracejam, não conseguindo reunir consenso à volta do melhor plano para derrotar os castelhanos. Vista de qualquer ângulo, a vitória parece uma missão impossível.
O exército castelhano, esse, é incomensuravelmente superior - 31 mil soldados, incluindo cinco mil lanças, dois mil ginetes (cavalaria ligeira), oito mil besteiros e 15 mil peões.

Vendo que um entendimento entre os conselheiros seria impossível, Álvares Pereira abandona a sala, deixando a cidade de Abrantes, na manhã seguinte, disposto a enfrentar os castelhanos apenas com os seus dois mil soldados.
O plano genial de Álvares Pereira
Dom Nuno decide confrontar o inimigo longe de Lisboa e segue com a sua hoste para a zona de Tomar. D. João I, entretanto, junta-se ao seu exército. Traz consigo os seus soldados e os aliados ingleses, dando finalmente razão ao condestável do reino.
Ambos os exércitos avançam de seguida por Atouguia, no concelho de Ourém, chegando em pouco menos de um dia a Porto de Mós, junto da estrada romana que faz a ligação entre Leiria e Alcobaça, e por onde as forças castelhanas já caminhavam.
A batalha de Aljubarrota acabou com a crise sucessória ocorrida após a morte de D. Fernando, garantindo a independência de Portugal face ao reino de Castela.
Caro leitor e cara leitora, está prestes a testemunhar um dos acontecimentos mais decisivos da História de Portugal. Escolha, por isso, um lugar confortável em casa, na praia ou no autocarro a caminho do trabalho.
Pode até providenciar as pipocas e outras pequenas comodidades porque vale a pena dedicar a sua atenção aos momentos que se seguem e que mostram como um pequeno exército, liderado por um génio militar, derrotou uma das forças armadas mais poderosas da Idade Média.
A escolha do terreno para travar a batalha
Dom Nuno está agora a estudar o melhor local para intercetar o exército castelhano. Encontra um terreno planáltico, a sul da ribeira de Calvaria, com acessos acidentados.
As movimentações dos militares portugueses não passam despercebidas aos castelhanos. Embora em vantagem numérica, tentam evitar o confronto. Aguardam ainda a chegada de mais soldados que estão a caminho e querem continuar a marcha para Lisboa, onde planeiam travar a batalha.

Fazem, por isso, um desvio por um caminho secundário em direção a Calvaria. O exército português, não os larga, vai na sua sombra. Deslocam-se paralelamente até ficarem a pouco mais de 350 metros de distância do inimigo.
Os preparativos para o combate
Iniciam-se então os preparos, com os militares portugueses a montar várias emboscadas no terreno. Fossos cavados com rapidez são os primeiros obstáculos colocados ao exército de Castela. Seguem-se as covas de lobo, buracos cónicos invertidos, com dois metros de profundidade, no fundo do qual é cravada uma estaca pontiaguda.
A tática do quadrado dos militares portugueses
O exército assume a sua posição para o combate, formando um quadrado com vanguarda, alas esquerda e direita e retaguarda. Na primeira força de impacto, cerca de 600 lanceiros são comandados por Dom Nuno Álvares Pereira. Ao fundo, sob a liderança de Dom João I, estão os besteiros, os lanças e os peões.
As laterais, por fim, são formadas por soldados de infantaria, que protegem os flancos do quadrado, e por besteiros, preparados para lançar flechas sobre o inimigo.
A investida do rei de Castela
A vanguarda castelhana demora ainda algumas horas a reagir, não obstante a sua facilidade em ocupar toda a largura do planalto. Mas a ânsia de chegar a Lisboa e o desprezo por um exército tão diminuto levou Juan I de Castela a iniciar o combate ao final do dia.
A configuração do terreno e as armadilhas provocam as primeiras baixas, obrigando os castelhanos a apear e a afunilar a frente de combate. Seguem em coluna por um caminho estreito e livre de fortificações, mas que lhes retira toda a vantagem numérica.

Aos poucos vão conseguindo penetrar o interior do quadrado pelo lado frontal. Mas estão encurralados e sem capacidade de manobra. São agora um alvo vulnerável de archeiros portugueses e ingleses ao serviço do reino de Portugal.
O que resta do exército castelhano foge, aterrorizado, incluindo o rei de Castela, que se refugia em Santarém, partindo daí para Sevilha. No campo de batalha, as baixas portuguesas foram aproximadamente mil mortos, enquanto no exército castelhano se situaram em cerca quatro mil mortos e cinco mil prisioneiros.
A vitória e as repercussões no reino de Portugal
As consequências da batalha foram várias, em Portugal e em Castela. A vitória de Aljubarrota é tão esmagadora que assegura a Dom João I a continuidade no trono português até à sua morte em 1433.

A aliança luso-britânica sai também reforçada, sendo definitivamente selada um ano depois, com a assinatura do Tratado de Windsor e o casamento do rei Dom João I com a princesa inglesa Dona Filipa de Lencastre.
A tática do quadrado de Nuno Álvares Pereira, essa, inaugurou uma nova era nos combates militares, tornando-se num exemplo notável de como uma estratégia bem planeada e executada pode superar a superioridade numérica do inimigo.
Referências do artigo
1385 – Batalha de Aljubarrota. Fundação batalha de Aljubarrota
Diogo Cardoso Gomes. Imagens e Memórias de uma Guerra Comum: as Batalhas de 1383-1385 nas Crónicas de Pero López de Ayala e de Fernão Lopes. Open Editions Journals