Os elefantes e o ébano: estudo revela colapso de mutualismo vital nas florestas africanas

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O elefante africano é o maior animal terrestre, podendo pesar até 6 toneladas e medir mais de 3 metros de altura ao ombro.

O artigo analisa a relação entre os elefantes-da-floresta-africanos (Loxodonta cyclotis) e o ébano-africano (Diospyros crassiflora), demonstrando que o declínio simultâneo de ambos resulta de uma forte dependência ecológica. Os elefantes, além de serem dispersores de sementes de longo alcance, desempenham um papel essencial na regeneração do ébano, uma árvore de crescimento extremamente lento, altamente valorizada pela sua madeira e considerada vulnerável devido à exploração madeireira e à desflorestação.

Os frutos grandes do ébano e com sementes duras são especialmente adaptados para serem dispersos por megafauna como os elefantes.

Ao longo das últimas décadas, a caça furtiva para o comércio ilegal de marfim levou a uma redução de cerca de 86% das populações de elefantes, o que compromete não apenas a sua sobrevivência, mas também a regeneração de árvores com sementes grandes, como o ébano.

A ausência de elefantes compromete seriamente a continuidade populacional da espécie

O estudo recorreu a dados demográficos, espaciais, genéticos e experimentais recolhidos em quatro áreas florestais de Camarões, escolhidas de acordo com diferentes níveis de pressão cinegética. Os investigadores constataram que, em florestas onde os elefantes ainda estavam presentes, a proporção de plântulas (designação dada em botânica e em agronomia ao embrião vegetal já desenvolvido que emerge da semente) de pequeno porte (<5 cm de diâmetro) representava quase metade da população de ébanos, enquanto nas áreas sem elefantes esse valor caía para apenas 15%.

Isto traduz-se numa redução de cerca de 68% na regeneração de novos indivíduos, confirmando que a ausência de elefantes compromete seriamente a continuidade populacional da espécie.

A análise espacial revelou que, na ausência de elefantes, as plântulas crescem em agrupamentos próximos das árvores-mãe, refletindo um padrão típico de dispersão por gravidade. Já nas áreas com elefantes, observou-se maior dispersão genética e espacial, indicativa da função essencial dos paquidermes no transporte de sementes a longas distâncias.

As experiências

As experiências realizadas permitiram ainda esclarecer os mecanismos que explicam esta relação mutualista. Embora se pensasse que o principal benefício fosse a passagem das sementes pelo trato digestivo dos elefantes, que em algumas espécies melhora a germinação, os resultados demonstraram que o efeito mais importante é a proteção conferida pelas fezes. Sementes expostas no solo foram até 8,5 vezes mais predadas por roedores do que sementes presentes em excrementos de elefante.

Estes gigantes comunicam entre si através de sons de baixa frequência, inaudíveis para os humanos, que podem percorrer quilómetros pela floresta.

Além disso, as sementes em fezes apresentaram taxas de germinação três vezes superiores às sementes deixadas dentro dos frutos. Assim, o estrume dos elefantes não só ajuda a remover a polpa inibidora da germinação, como também funciona como barreira contra predadores, aumentando substancialmente as hipóteses de sobrevivência das plântulas.

Curiosamente, o estudo não encontrou forte evidência para os efeitos clássicos de dependência negativa da densidade (hipótese de Janzen-Connell), normalmente associados à mortalidade de plântulas próximas das árvores-mãe.

O ébano africano (Diospyros crassiflora) é uma das madeiras mais valiosas do mundo, famosa pela cor negra intensa e densidade elevada.

As implicações são profundas. A extinção local dos elefantes leva a um colapso progressivo da regeneração do ébano, provocando uma perda de fluxo genético, aumento da consanguinidade e maior vulnerabilidade populacional. Roedores, antílopes e primatas, embora possam ocasionalmente dispersar ou consumir frutos, não desempenham um papel substituto eficaz, limitando-se muitas vezes a destruir as sementes. Assim, a sobrevivência do ébano está diretamente ligada à presença dos elefantes.

A investigação conclui que a eliminação destes dispersores não tem apenas consequências na biodiversidade animal, mas afeta também a estrutura, composição e capacidade de armazenamento de carbono das florestas tropicais africanas. O colapso do mutualismo entre “ébano e marfim” poderá ter repercussões ecológicas, económicas e culturais profundas, reforçando a urgência da conservação conjunta de ambos: os elefantes e as árvores que deles dependem.

Referência da notícia:

Vincent Deblauwe et al.,Declines of ebony and ivory are inextricably linked in an African rainforest.Sci. Adv.11,eady4392(2025).DOI:10.1126/sciadv.ady4392