NOAA declara condições de La Niña presentes no Pacífico: saiba o que esperar

A NOAA declarou oficialmente condições de La Niña nesta quinta-feira (9). A Meteored alerta que é necessário cautela em reproduzir esta informação.

    Anomalias de temperatura da superfície do mar médias centradas na semana do dia 1° de outubro. Créditos: CPC/NOAA.
    Anomalias de temperatura da superfície do mar médias centradas na semana do dia 1° de outubro. Créditos: CPC/NOAA.

    A Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA) emitiu na manhã de quinta-feira (9) um La Niña Advisory, um aviso oficial que indica que as condições típicas do fenómeno La Niña estão presentes no Pacífico tropical e devem persistir nos próximos meses.

    No entanto, parte da comunidade científica discorda que as condições estejam realmente configuradas ou que irão se manter pelo período necessário para caracterizar o fenómeno. Entenda a seguir o que diz o boletim da NOAA, quais critérios são usados para identificar o fenómeno e por que é que é preciso cautela antes de reproduzir esta informação.

    O que diz o aviso de La Niña da NOAA?

    O aviso emitido hoje (9) pelo Centro de Previsão Climática da NOAA declarou oficialmente o status La Niña. De acordo com o texto:

    Condições de La Niña estão presentes e devem persistir entre dezembro de 2025 e fevereiro de 2026, com transição provável para neutralidade entre janeiro e março de 2026.

    A NOAA indica que as anomalias negativas da temperatura da superfície do mar (TSM) se expandiram pelo Pacífico central e leste, com o índice Niño-3.4 atingindo -0,5°C na última semana.

    Evolução temporal das anomalias de TSM nas regiões de monitorização do Niño. Créditos: CPC/NOAA.
    Evolução temporal das anomalias de TSM nas regiões de monitorização do Niño. Créditos: CPC/NOAA.

    O relatório também cita anomalias negativas subsuperficiais até 200 metros de profundidade, ventos de leste mais intensos e convecção reforçada sobre a Indonésia, sinais típicos da fase fria do ENSO. Ainda assim, a própria NOAA destaca que o evento atual deve permanecer fraco, com efeitos limitados no clima global.

    Como a NOAA declara um evento de La Niña?

    Os critérios do CPC-NOAA para a identificação de um evento de La Niña incluem:

    • TSM na região Niño-3.4 deve ser pelo menos 0,5 °C mais fria que a média climatológica;
    • A anomalia de TSM de -0,5 °C ou menor deve persistir ou ser projetada para persistir por vários períodos de 3 trimestres consecutivos sobrepostos (por exemplo: outubro-novembro-dezembro, novembro-dezembro-janeiro, dezembro-janeiro-fevereiro);
    • Os ventos alísios do leste no Pacífico tropical devem estar mais intensos que o normal.

    Além disso, é necessário que exista acoplamento entre oceano e atmosfera, ou seja, uma resposta consistente dos padrões de vento e chuva ao arrefecimento do Pacífico.

    Porém, o sistema de alerta de eventos La Niña e El Niño é baseado não apenas na análise de dados de temperatura e pressão e no acoplamento entre oceano e atmosfera, mas também na modelagem e previsão climática - o que introduz muita incerteza. O fluxograma abaixo resume o processo utilizado pelo CPC-NOAA.

    Fluxograma para a declaração de condições de La Niña. Créditos: Adaptado de NOAA Climate.gov.
    Fluxograma para a declaração de condições de La Niña. Créditos: Adaptado de NOAA Climate.gov.

    Este fluxograma diz-nos que, se há condições de anomalia mensal de TSM abaixo de -0,5 °C, a próxima pergunta a ser feita é se há perspetiva dessas anomalias persistirem nas próximas estações - e essa resposta vem da opinião dos meteorolgistas a respeito das previsões.

    Caso a resposta seja sim, passa-se para a avaliação da atmosfera onde precisa ser verificado se existem indicativos do fortalecimento da circulação de Walker (como supressão da chuva no Pacífico central e mais chuva sobre a Indonésia), para caracterizar La Niña.

    Um anúncio precoce? Cautela ainda é necessária

    Apesar do aviso oficial, os especialistas da Meteored consideram que o atual cenário no Pacífico equatorial não reflete uma La Niña. Os pontos-chave para considerar o aviso da NOAA como precoce são:

    • As anomalias de TSM abaixo de -0,5 °C são absolutamente recentes, não há persistência sequer por 4 semanas consecutivas;
    • A média da previsão (chamada de “ensemble”) dos modelos dinâmicos indica anomalias fracas, muito próximas do limiar de -0,5 °C, com retorno para a neutralidade já a partir de dezembro;
    • Os modelos estatísticos, por sua vez, praticamente nem alcançam o limiar necessário;
    • Esta é a primeira vez desde março que um dos ensembles alcança limiares de La Niña; entre março e agosto tanto os modelos dinâmicos quanto estatísticos mantiveram as previsões dentro da neutralidade, o que reflete incerteza da previsão.
    Previsão dos modelos estatísticos e dinâmicos do ENOS. Créditos: CPC/NOAA.
    Previsão dos modelos estatísticos e dinâmicos do ENOS. Créditos: CPC/NOAA.

    Em janeiro de 2025 a NOAA declarou a formação do evento La Niña mais tardio da história, mas precisou de voltar atrás em abril, devido à falta de persistência do arrefecimento.

    Apesar do quadro atual ser diferente do ano passado, uma vez que temos o Dipolo do Índico a favorecer o arrefecimento das águas na região do ENOS, a avaliação crítica das condições observadas no Oceano Pacífico e da evolução das previsões dos modelos mostra que é cedo para afirmar a presença de La Niña.

    A Meteored acredita que irá haver um arrefecimento do Oceano Pacífico, que até pode ter uma resposta atmosférica e afetar o clima em vários países, mas será uma condição de arrefecimento dentro da neutralidade, sem persistência durante 5 meses.

    Referência da notícia

    EL NIÑO/SOUTHERN OSCILLATION (ENSO) DIAGNOSTIC DISCUSSION, publicado em 9 de outubro de 2025.