Poeira do Saara carrega partículas radioativas para a França

De acordo com uma descoberta recente, no último evento de entrada de poeira do deserto do Saara sobre a Europa, a França recebeu de volta parte da radioatividade deixada há 60 anos atrás por experiências nucleares feitas no deserto argelino.

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Fotografia tirada no dia 6 de fevereiro de 2021 na região de Jura, França, ilustrando a presença de poeira vinda do deserto do Saara. Fonte: ACRO.

Nos primeiros dias de fevereiro uma espessa nuvem de poeira vinda do deserto do Saara cobriu parte da Europa, mudando a cor do céu e cobrindo a superfície com uma poeira alaranjada. Apesar de ser um fenómeno comum, esse evento foi um pouco anormal devido às dimensões da pluma de poeira. Agora, uma descoberta recente identificou mais uma anormalidade desse evento!

Na França, um dos países mais atingidos pela poeira, a Associação pelo Controlo de Radioatividade no Ocidente (ACRO) detetou a presença de um componente radioativo na poeira que atingiu o país! A ACRO mediu níveis anormais de césio-137 em amostras de poeira recolhidas no dia 06 de fevereiro num carro coberto por poeira na região de Jura, na fronteira com a Suíça.

O césio-137 é um componente radioativo que não está presente na natureza e que vem necessariamente do processo de fissão nuclear provocada por uma explosão nuclear. O seu tempo de vida útil é longo, a cada 30 anos este composto perde metade de sua radioatividade. Após 7 ciclos de 30 anos considera-se que resta apenas 1% da sua radioatividade.

A ACRO estima que 80.000 Bq por km2 de césio-137 caíram. É uma concentração muito baixa que não chega a ser perigosa para a saúde, o que surpreende é a ironia por trás do acontecimento! Isto porque esses componentes radioativos são fruto de testes nucleares realizados pela França no deserto da Argélia nos anos 60. Portanto a França está a receber de volta a radioatividade que colocou no deserto do Saara há 60 anos!

No dia 13 de fevereiro de 1960 a França realizou o seu primeiro teste nuclear no Saara, na região de Reggane, Argélia, quando explodiu a bomba nuclear Gerboise Bleue, expondo os seus próprios soldados e a população local à radiação. Desde esse primeiro teste até ao último em 1996, a França chegou a realizar mais de 200 explosões nucleares, a maioria na Polinésia Francesa, mas os primeiros 17 foram no deserto argelino.

Como mencionado anteriormente, a chegada de plumas de poeiras vindas do deserto do Saara é comum na Europa, principalmente para os países do Mediterrâneo. Na atual temporada, pelo menos 3 eventos já ocorreram.

O avanço dessas plumas de poeira depende da intensidade e direção dos ventos próximos à superfície e em níveis mais elevados da atmosfera, os jatos de altos níveis, que são responsáveis por esse transporte intercontinental.

Atualmente uma nova pluma de poeira está a avançar pelo Mediterrâneo e chegará a países como Espanha, França, Reino Unido e Alemanha. Portanto, nos próximos dias, paisagens alaranjadas como aquelas registadas no início de fevereiro poderão ocorrer novamente.