Cientistas portugueses descobriram quem é o responsável pela evolução do cancro
Há uma razão por que só algumas mutações das células cancerígenas desencadeiam a evolução da doença. Ao compreenderem o que influencia o processo, os investigadores da Universidade de Lisboa abriram a porta a tratamentos mais personalizados.

Por que há mutações que levam ao desenvolvimento de cancro em determinados tecidos e órgãos e noutros não? Essa foi a pergunta que levou os investigadores do Instituto de Biossistemas e Ciências Integrativas (BioISI) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa a analisar células cancerígenas de mais de 11 mil casos de doença oncológica.
O estudo teve como ponto de partida a plataforma Cancer Genome Atlas Program, lançado em 2005, nos Estados Unidos, e que agrega bases moleculares de mais de 30 tipos de cancro. Os resultados obtidos com este trabalho são promissores, podendo vir a melhorar os tratamentos oncológicos.
A influência das proteínas
De acordo com o estudo publicado na revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences, o grande culpado da evolução de doenças oncológicas são as interações entre várias proteínas, que fazem com que a célula cancerosa se desvie do seu comportamento padrão.

Os investigadores do Instituto de Biossistemas e Ciências Integrativas descobriram, na prática, que, diante do comportamento indisciplinado das proteínas, as células cancerosas agem como uma “turma malcomportada”, condicionado os efeitos da mutação do fato cancerígeno.
São alterações genéticas no ADN de uma célula que levam à sua transformação em cancerosa, um processo chamado carcinogénese. Estas mutações podem ocorrer naturalmente ou ser induzidas por agentes cancerígenos, desregulando o ciclo de vida da célula e levando ao crescimento descontrolado, podendo resultar num tumor e, eventualmente, num cancro.
As conclusões são animadoras para o futuro dos tratamentos oncológicos, uma vez que, em teoria, irão permitir personalizar e direcionar cada vez melhor as terapêuticas em variadíssimos tipos de cancro, explicou em comunicado a Faculdade de Ciências, que realizou a investigação juntamente com médicos do Hospital de Santa Maria, em Lisboa.
O efeito inibidor ou catalisador
Tendo como base a questão de saber por que é que, só em alguns casos, as mutações dão origem ao desenvolvimento de cancro, a equipa do BioISI focou o seu trabalho na comunicação entre proteínas.
A analise serviu para concluir que a complexidade destas interações e a ascendência que exercem sob as células cancerosas têm o poder de influenciar a proteína driver mutada tanto de uma forma positiva (inibindo a doença) como negativa (fazendo-a evoluir). Isto significa que estas proteínas vizinhas são alvos promissores para tratamentos com fármacos.
É uma proteína que sofreu uma alteração genética (mutação), levando a assumir funções celulares desreguladas, que contribuem para o desenvolvimento de doenças, como o cancro. Estas proteínas são cruciais para a progressão da doença, impulsionando o crescimento e a sobrevivência das células doentes.
Apesar das conclusões animadoras para futuras terapias, os investigadores do BioISI são cautelosos nos seus prognósticos, advertindo ser ainda necessário encarar estes desenvolvimentos científicos com doses moderadas de otimismo.

Ainda há um longo caminho a percorrer pois mesmo que sejam desenvolvidas novas terapias, será preciso garantir que não apresentam problemas de toxicidade ou outros efeitos adversos. Ainda assim, o estudo é um passo fundamental, que permitiu identificar vários alvos, aumentando, por isso, a probabilidade de alcançar o tratamento eficaz para a doença.
Referência da notícia
João A. I. Miranda, Márcia F. S. Vital, Margarida Carrolo &Francisco R. Pinto. When neighbors play a role: A systems-level analysis of protein interactions conditioning cancer driver mutation effects. Proceedings of the National Academy of Sciences