Microplásticos: baleias ingerem milhões de partículas por dia

Novo estudo mede a quantidade de microplásticos consumidos diariamente pelas baleias no seu processo de digestão. Os resultados do estudo são surpreendentes e alertam para a forma como estes resíduos afetam os ecossistemas marinhos. Veja mais aqui!

baleias; microplásticos
As baleias podem ingerir diariamente milhões de partículas microplásticas.

Os mares e oceanos estão sujeitos a vastas pressões de carácter ambiental que afetam de forma negativa a vida marinha e que são responsáveis pelo decréscimo da biodiversidade e a debilitação dos seus ecossistemas.

Este conjunto de pressões sobre os mares e oceanos resultam em processos de acidificação e desoxigenação das suas águas, em virtude do desequilíbrio na capacidade de absorver o carbono da atmosfera e do aumento da temperatura da água, enquadrados no atual processo de alterações climáticas.

A poluição marinha e os microplásticos

Durante décadas pensou-se que os mares e oceanos teriam capacidade por si sós de diluir, ou seja, eliminar toda a poluição que neles fosse descartada, o que, de facto, não encontrou paralelo com a realidade.

A poluição marinha é então indissociável das atividades humanas, quer seja através da exploração dos recursos naturais, sejam vivos, através da pesca, ou não vivos, pela exploração e prospeção de combustíveis fósseis como o petróleo e o gás natural, ou através do transporte marítimo.

Mas a verdade é que não são estas as grandes responsáveis pelo lixo marítimo, mas sim parte das atividades humanas desenvolvidas em terra, principalmente em países onde a emissão de substâncias nocivas pela indústria é menos controlada.

Desde 1950, quando se deu a produção em grande escala de materiais sintéticos, que o ser humano gerou um total de 8,3 bilhões de toneladas métricas de plástico, segundo dados de um estudo efetuado em 2017 pela Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, Universidade da Geórgia e Sea Education Association. Uma quantidade suficiente para cobrir a Argentina e um peso equivalente ao de 80 milhões de baleias azuis, 1 bilhão de elefantes ou 25.000 Empire State Buildings.

A sua produção anual foi-se multiplicando com o passar dos anos, passando de 2 milhões de toneladas métricas em 1950 para mais de 400 milhões em 2015. Essa tendência não parece recuar: da totalidade do plástico gerado entre estas duas datas, metade foi produzida nos últimos anos. Nenhum dos plásticos é biodegradável e destes, apenas 9% foram reciclados, enquanto 12% foram incinerados e 79% acabaram em aterros e no meio ambiente.

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Como vimos, uma boa parte deste plástico acaba no meio ambiente e chega aos mares e oceanos, tornando-se uma preocupação crescente. A água, o sol, o vento e os microrganismos vão degradando o plástico descartado nos mares e oceanos até que este se transforme em partículas minúsculas de 0.001 a 5 mm ou microfibras de 0.8 a 0.9 mm de comprimento, de peso variável, dependendo do material que são feitos.

Tais partículas são ingeridas pelo plâncton, bivalves, peixes e até baleias, que as confundem com comida. Estima-se que pelo menos 1.500 espécies tenham ingerido esse tipo de resíduo nos seus habitats naturais.

As baleias, em particular, alimentam-se de pequenos crustáceos planctónicos, conhecidos por krill. A sua alimentação dá-se através de um processo de filtragem e através dele, as baleias podem ingerir diariamente até 10 milhões de partículas microplásticas, segundo um estudo publicado na revista Nature.

O estudo centrou-se nas seguintes espécies: baleia azul (Balaenoptera musculus), baleia jubarte (Megaptera novaeangliae) e baleia comum (Balaenoptera physalus). Para estimar a ingestão diária desse material antropogénico e os padrões de alimentação das baleias, o grupo de cientistas combinou dados sobre microplásticos na corrente da Califórnia com informações sobre o comportamento alimentar de 191 baleias, marcadas com dispositivos de monitorização, na última década.

Os cientistas chegaram à conclusão de que as baleias azuis consomem até 10 milhões de partículas microplásticas diariamente; as baleias comuns, entre 3 e 10 milhões; e a baleia jubarte depende das suas presas: cerca de 4 milhões se se alimentarem de krill e 200.000 microplásticos se se alimentarem de peixe.

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Os microplásticos estão presentes em todos os mares e oceanos.

Estes resultados impressionantes dão-se não somente pelo consumo de água, mas também por uma “ingestão secundária”: o krill, pequenos crustáceos que habitam praticamente todos os mares e oceanos do mundo e que são um elemento fundamental na cadeia alimentar dos ecossistemas oceânicos. Assim, “o krill come o plástico e depois a baleia come o krill” , explicou Matthew Savoca, da Estação Marinha Hopkins da Universidade de Stanford.

Segundo Savoca, é provável que as taxas de consumo desse resíduo plástico sejam ainda maiores em baleias que se alimentam em regiões mais poluídas, como o mar Mediterrâneo.

Ricos para a saúde das baleias

Apesar de os efeitos na saúde das baleias não serem ainda detalhadamente conhecidos, os autores apontam que pode existir um risco fisiológico e toxicológico se os microplásticos se acumularem nos seus organismos.

"Ainda não sabemos, mas outros estudos mostraram que, se os plásticos forem pequenos o suficiente, podem passar pela parede intestinal e atingir os órgãos internos, embora os efeitos a longo prazo ainda não sejam claros" - explica Shirel Kahane-Rapport, autora principal do estudo e investigadora na Universidade Estatal da Califórnia em Fullerton e na de Stanford.

Para este grupo de cientistas, o próximo passo é verificar quanto plástico as baleias libertam através das suas excreções e quanto realmente fica retido nos seus organismos, para melhor determinar os efeitos na saúde destes indivíduos.

Porque para estes investigadores, os microplásticos “são um estressor adicional para as espécies que lutam para se recuperar da caça histórica às baleias e dos impactos antropogénicos”, um conjunto cumulativo de ameaças que requerem mais atenção.

Está comprovado que os microplásticos existem por toda a parte, mesmo nos mais recônditos lugares do planeta, como no cume do Everest ou nas profundezas da Fossa das Marianas. E mesmo dentro dos nossos próprios organismos. Urge alterar este desolador e preocupante cenário!