Esta igreja fica 'no meio do nada' — mas é uma das mais belas de Portugal
Dizem que é uma das mais bonitas do país, mas a entrada é quase um privilégio secreto. Descubra onde fica a ‘igreja proibida’ e quando é que esta abre.

O que aconteceria se estivesse a conduzir por uma estrada de terra batida, ladeada por campos a perder de vista, e de repente, aparecesse uma igreja no horizonte. Mas, atenção, porque esta não seria uma igreja qualquer. Era uma daquelas que parece saída de um filme, plantada ali no meio da lezíria ribatejana, como se tivesse sido esquecida por engano — ou talvez por milagre.
Tem uma resposta? É bom que tenha, porque este cenário é bem real — e pode encontrá-lo em Vila Franca de Xira.
“Para a alcançarmos, são precisos oito quilómetros numa estrada de terra batida de planície agrícola, uma distância que, por si só, amplia a sua solidão. Esta é uma paisagem reduzida ao mínimo”, nota o ‘Museu da Paisagem’.
O detalhe curioso? Está fechada praticamente o ano inteiro. Sim, leu bem: só abre as portas uma vez por ano, e mesmo assim é preciso marcar no calendário.
Uma construção que sobressai
A igreja foi construída no século XVIII, por iniciativa de D. Tomás de Almeida, o primeiro Patriarca de Lisboa, e desenhada por José Manuel de Carvalho e Negreiros, como forma de agradecer “agradecer a Deus as colheitas”.
Contudo, não foi por capricho que a mandaram erguer sobre uma plataforma. É que os campos que a rodeiam — as lezírias — são conhecidos por serem férteis, planos e, digamos, ligeiramente temperamentais quando o Tejo decide sair do leito.
“Sem nenhum ponto de comparação por perto, a ermida, já de si de grandes proporções, ganha em imponência. Não é por acaso. Assim, podia ser avistada a muitos quilómetros por qualquer trabalhador que na sua presença procurasse ânimo e proteção”, garante o ‘Museu da Paisagem’.

Afinal, “qualquer elemento na vertical sobressai num espaço raso”, e esta igreja sobressai com vontade própria. “A Ermida de Alcamé, única construção na extensa Lezíria de Vila Franca de Xira, é esse elemento.”
Devoções, campinos e… maçãs voadoras?
E de onde é que surgiu esta veneração? A devoção a Nossa Senhora de Alcamé tem raízes no povo da lezíria — campinos, lavradores, pescadores — que viam na igreja uma espécie de casa de campo divina.
Uma das lendas locais conta que a imagem da Senhora salvou um pastor de ser mordido por uma serpente… com uma maçã. “A Virgem atirou uma maçã à boca da serpente e salvou o homem”, lê-se no site da CM Vila Franca de Xira.
Ainda assim, a romaria à Nossa Senhora de Alcamé só começou no final do século XIX, organizada por lavradores com o apoio da Companhia das Lezírias. Durante décadas, foi uma tradição viva, com barcos enfeitados a subir o Tejo e carroças floridas a atravessar os campos. Depois veio o silêncio — as revoluções também fazem destas coisas.

Mas em 2002, graças ao Rancho de Varinos de Vila Franca de Xira, a tradição voltou a ganhar vida. Desde então, todos os anos, em junho, centenas de pessoas voltam a caminhar, a cavalo ou a pé, cerca de 10 quilómetros até à igreja. Há missa campal, bênção dos campos, procissão, fado, folclore, e quem sabe até uma sardinhada improvisada. É precisamente nestes dias que a Igreja abre as suas portas.
Fora do radar
Fora da romaria, a igreja fecha-se de novo no seu sossego. Não há visitas, nem horários, nem filas. Só o silêncio dos campos e o som distante dos cavalos a galopar. E talvez seja isso que a torna tão especial — um lugar que não se vê todos os dias, mas que se guarda na memória como se tivesse sido descoberto por acaso, numa viagem onde o caminho é tão bonito quanto o destino.
Se quiser visitá-la, marque na agenda: junho é a sua única oportunidade. Este ano, a celebração acontece a 21 de junho, mais precisamente.