A IA cria um mapa 3D do campo magnético do Sol e antecipa tempestades solares perigosas
Uma equipa da Universidade do Havai desenvolveu uma ferramenta de inteligência artificial capaz de mapear o campo magnético solar em três dimensões com uma precisão inédita. A descoberta promete melhorar a previsão das tempestades solares que afetam os satélites, as comunicações e as redes elétricas na Terra.

Os investigadores do Instituto de Astronomia da Universidade do Havai (IfA) estão a transformar a forma como a ciência observa e compreende o Sol.
O projeto, liderado pela Universidade do Havai e ligado ao Telescópio Solar Daniel K. Inouye - construído e gerido pela Fundação Nacional da Ciência dos EUA (NSF) através do Observatório Solar Nacional (NSO) em Haleakalā - foi recentemente publicado no prestigiado Astrophysical Journal.
O impacto do clima espacial na vida quotidiana
“O Sol é a fonte mais poderosa de clima espacial que pode afetar a nossa vida quotidiana na Terra, especialmente agora que estamos tão dependentes da tecnologia”, explicou Kai Yang, investigador de pós-doutoramento no IfA e líder do estudo. Segundo Yang, o campo magnético solar é o motor de fenómenos explosivos como as erupções solares e as ejeções de massa coronal, eventos que podem perturbar os sistemas de satélites, as redes elétricas e as comunicações globais.
Compreender o que desencadeia estas explosões é fundamental para as antecipar. Uma melhor previsão permitiria alertas precoces e protegeria as infraestruturas críticas que sustentam a vida moderna.
Um puzzle difícil de resolver
O grande desafio para os cientistas sempre foi medir com exatidão o campo magnético do Sol. Os instrumentos atuais podem mostrar como as linhas magnéticas estão inclinadas, mas não conseguem determinar se estão a apontar para a Terra ou para longe dela. Yang compara a situação com a de olhar para uma corda de lado: consegue ver a sua forma, mas não consegue dizer qual é a extremidade mais próxima.

A isto acresce o problema da altura. Quando observam o Sol, os astrónomos veem várias camadas ao mesmo tempo, o que torna difícil determinar a que nível se encontra cada estrutura magnética. A situação torna-se ainda mais complexa nas manchas solares, onde fortes campos magnéticos deformam a superfície solar e causam subsidência.
Inteligência artificial guiada pelas leis da física
Para ultrapassar estes obstáculos, os investigadores do IfA trabalharam em conjunto com o Observatório Solar Nacional e o Observatório de Alta Altitude do Centro Nacional de Investigação Atmosférica (NCAR). O resultado foi um novo sistema de aprendizagem automática que combina dados reais com princípios físicos fundamentais.
O algoritmo, denominado Haleakalā Disambiguation Decoder, baseia-se numa regra simples mas poderosa: os campos magnéticos formam laços contínuos e não têm princípio nem fim. A partir desta premissa, a inteligência artificial pode deduzir a direção real do campo magnético e estimar a altura correta de cada uma das suas camadas.
Resultados promissores e novas possibilidades
A técnica foi testada com sucesso em modelos computacionais detalhados do Sol, incluindo regiões calmas, zonas ativas brilhantes e manchas solares. A sua precisão é especialmente valiosa para interpretar as imagens de altíssima resolução captadas pelo Telescópio Solar Daniel K. Inouye, o mais avançado do mundo no seu género.
“Com esta nova ferramenta de aprendizagem automática, o telescópio pode ajudar a construir um mapa tridimensional muito mais exato do campo magnético solar”, disse Yang. Além disso, o método pode revelar características associadas, como correntes vectoriais eléctricas na atmosfera solar, que até agora têm sido extremamente difíceis de medir.
Rumo a melhores previsões solares
Graças a estes avanços, os cientistas podem observar mais claramente a paisagem magnética do Sol e melhorar as previsões da sua atividade. Isto representa um passo fundamental para antecipar fenómenos solares extremos e reduzir o seu impacto na tecnologia e na vida na Terra.
Num mundo cada vez mais interligado e dependente de sistemas sensíveis à meteorologia espacial, compreender o Sol já não é apenas uma questão astronómica, mas uma necessidade estratégica para a sociedade moderna.
Referência da notícia
Kai E. 凯 Yang 杨 et al, Spectropolarimetric Inversion in Four Dimensions with Deep Learning (SPIn4D). II. A Physics-informed Machine Learning Method for 3D Solar Photosphere Reconstruction, The Astrophysical Journal (2025). DOI: 10.3847/1538-4357/ae12ef